Contrariando decisão judicial, Vale avança com negociações individuais e remoções em Itabira - Projeto ManuelzãoProjeto Manuelzão

Contrariando decisão judicial, Vale avança com negociações individuais e remoções em Itabira

10/06/2022

Justiça não acata solicitação da Vale para encerrar processo por violações aos direitos das pessoas atingidas; entretanto, empresa executa ações não pactuadas judicialmente

[Matéria publicada pela comunicação do Instituto Guaicuy nesta quinta-feira, 9 de junho, e republicada aqui com algumas edições.]

Na sexta-feira, 3, a juíza responsável por julgar a Ação Civil Pública (ACP) contra a Vale por danos investigados em Itabira não acatou solicitação da empresa para extinção do processo. A ACP, ajuizada em 25 de abril pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), tem o objetivo de garantir a reparação integral dos danos causados às pessoas atingidas pelas barragens de mineração e diques pertencentes ao Sistema Pontal, localizado em Itabira, a 111 quilômetros de Belo Horizonte.

A mineradora argumentou, em pedidos feitos em 23 de maio, que o MPMG estaria se baseando em “possíveis danos futuros e hipotéticos”. Além disso, a Vale afirmou que tem se reunido com a comunidade local e que mantém diálogo com a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) para executar suas ações na região e construir um “Termo de Compromisso” sobre as remoções em Itabira.

A juíza responsável não acatou as solicitações da empresa e determinou a continuidade da Ação Civil Pública. Nessa ACP, inclusive, consta solicitação do MPMG para que a Vale custeie o trabalho de uma entidade que possa prestar assessoria técnica independente às pessoas atingidas. E também que seja determinado que a Vale proceda com medidas emergenciais para atender às famílias que precisarem ser removidas de suas residências.

Além de não extinguir a Ação, a decisão proferida pela juíza acata várias solicitações feitas pelo Ministério Público, determinando que:

a) A Vale terá que trazer provas às suas refutações contra laudos ou relatórios do Ministério Público, da Auditoria Técnica e da Assessoria Técnica Independente.

b) A Vale deve interromper as negociações individuais com as pessoas atingidas, de acordo com a Lei Estadual dos Atingidos por Barragens (PEAB).

c) A Vale deverá custear a assessoria técnica independente para as pessoas atingidas como forma de garantir a participação e informação da comunidade, que será responsável por escolher a entidade.

d) A Vale deverá custear a perícia que irá definir as ações de mitigação e prevenção de danos e impactos socioeconômicos, dentre outras, como a definição dos parâmetros de indenização.

e) Em caso de necessidade de remoção ou evacuação emergencial e compulsória das pessoas atingidas antes da conclusão do processo de reparação integral, a Vale deverá garantir moradia digna e adequada, custear as despesas com transporte dos bens das pessoas atingidas e providenciar que os imóveis desocupados estejam protegidos contra saques e roubos, além de pagar aos proprietários valores referentes a IPTU, energia e água. A mineradora deverá, também, custear as refeições das pessoas alojadas em pousadas e hotéis.

Negociações individuais e remoções em Itabira

Até então, a Vale não apresentou no processo nenhum recurso à decisão dada pela Justiça. Pelo contrário, a população de Itabira foi surpreendida com a notícia de que a mineradora assinou o “Termo de Compromisso” com a Defensoria Pública para realizar a remoção de famílias e proceder com as negociações individuais.

Segundo informações veiculadas pela imprensa na segunda-feira (6), o documento assinado com a DPMG sinaliza o início do processo de remoção de 11 famílias que residem nos bairros itabiranos de Bela Vista e Nova Vista. Esses bairros fazem fronteira com a barragem do Pontal, em que sete estruturas alteadas a montante devem ser descaracterizadas.

De acordo com o membro do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração de Itabira e região, Leonardo Ferreira, apesar de trágica, essa não é uma postura inédita da mineradora. “É muito estranho uma juíza ter que publicar uma decisão dizendo que a lei deve ser cumprida. A Vale tem infringido sistematicamente os direitos das pessoas atingidas em Itabira, principalmente os regulamentados pela Política Estadual dos Atingidos por Barragens (PEAB). Tanto em relação à transparência das ações que tem executado, quanto ao cronograma de quando as coisas vão acontecer. A comunidade vive um clima de tensão cotidiana”, afirma Ferreira.

As famílias citadas no “Termo de Compromisso” haviam sido notificadas da remoção no final do ano passado e permaneceram sem esclarecimentos até este mês. A falta de critérios e de detalhes, de acordo com Ferreira, têm causado ansiedade e aflição em quem vive na cidade. O Instituto Guaicuy se solidariza com as pessoas atingidas em Itabira e alerta para a necessidade de que a população possa ter materializado o princípio de paridade de armas no processo contra a Vale, para que seus direitos sejam integralmente reparados e que as violações não aconteçam mais.

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