Licenciamento: a 'joia da coroa' - Projeto ManuelzãoProjeto Manuelzão

Licenciamento: a ‘joia da coroa’

23/03/2016

Em seu artigo, o ambientalista Procópio de Castro comenta sobre o Licenciamento ambiental e alerta para o fato de que o modelo atual atende não às demandas da sociedade, mas sim o crescimento da economia.

Pela qualificação e quantificação das demandas de uma atividade e/ou empreendimento humano é possível levantar as consequências, os impactos no ambiente e, assim, estudar as ações necessárias para minimizar estas alterações no meio. Onde não for possível a minimização do dano, é preciso prever a reparação do mesmo pela compensação ambiental. Este é o mundo conceitual que embasa o licenciamento e está previsto e normatizado nas leis brasileiras dentro das premissas de comando e controle; comando dado pelas leis cujo controle é viabilizado pel fiscalização. O modelo legal demanda conhecimentos técnicos apurados e transdisciplinares nos estudos de viabilidade e impactos dos empreendimentos, pessoas qualificadas e bem remuneradas nos órgãos licenciadores, um número de fiscais adequados, assim como infraestrutura para o seu pleno funcionamento.

O licenciamento ambiental é a ‘joia da coroa’ da gestão sustentável por proporcionar a possibilidade do controle e minimização dos impactos das atividades humanas. Esta sustentabilidade seria alcançada pela realização de estudos prévios de avaliação dos impactos, de viabilidade adequacional com o local do empreendimento, de riscos da atividade para o meio ambiente e a sociedade, de opções tecnológicas menos degradantes, de levantamento de práticas da minimização destes impactos. Complementando os estudos, condicionantes são aplicadas para a implantação de um empreendimento, prevê-se monitoramento continuo e fiscalização em todas as fases e a participação da sociedade para opinando sobre ao que ela entende ser o melhor. Põe essas e outras ferramentas previstas no licenciamento, pressupõe-se que as atividades humanas podem ser efetivadas sem degradar ou pelo menos diminuir a degradação ambiental, usando hoje os recursos naturais e permitindo o seu uso no futuro pelas novas gerações.

A realidade não tem sido favorável à natureza devido à característica do sistema econômico vigente, no qual o lucro e o desenvolvimento constante demandam cada vez mais dos recursos naturais e incentiva o consumo desenfreado. Entretanto, esse modelo atende não às demandas da sociedade e sim ao crescimento da economia. O licenciamento de joia da coroa passou a ser considerado “impedimento” deste suposto desenvolvimento no discurso dos empreendedores. Por isso, o sistema e as normas do licenciamento passam por ataques sistemáticos que buscam a sua facilitação e agilidade. Assim, a questão dos impactos ambientais são minimizados sob a ótica do empreendedor e não o da natureza – nem da sociedade.
As taxas de licenciamento, compensações ambientais, multas por danos e outras ferramentas para capitalização de recursos deveriam ser a base do capital para a manutenção da estrutura; para o sistema de gestão ambiental das reparações aos danos. Infelizmente, elas têm sido desviadas pelo sistema político governante para outros fins, suas multas isentadas em perdões milionários e um desmonte sistemático do sistema de licenciamento ocorre a partir de baixos salários, falta de infraestrutura e falta de pessoal qualificado.

Os estudos de viabilidade e impactos, como o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), a (AIA) Avaliação de Impacto Ambiental, o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), têm apresentado baixa qualidade, deixando lacunas que suscitam pedidos de reestudo que atrasam o processo do licenciamento. Como estes estudos estão sob a responsabilidade do empreendedor, fica a questão de o porquê dessas lacunas: são por desconhecimento ou por falta de licitude?
As leis cada vez mais designam aos municípios o licenciamento de mais atividades econômicas, mas estes, majoritariamente, não têm condição técnicas, legais e estruturais para executá-las, pela falta de uma Secretaria de Meio Ambiente. A maior parte dos municípios mal tem uma diretoria de meio ambiente, sem Conselhos de políticas públicas e fundos instalados, e na ausência de Código Municipal de Meio Ambiente, os cargos são de indicação política e ocupados por quem não é da área. Além disso, no município as pressões de grupos econômicos acabam por ser o maior peso decisório e nem sempre a favor do socioambiental.

As áreas de fiscalização a as diretorias de meio ambiente sofrem de todo tipo de carência de infraestrutura para exercer o licenciamento e a fiscalização, ficando reduzidas à liberação de alvarás de funcionamento.
Neste momento vários movimentos de alteração da legislação estão em andamento nos estados (Ex.: lei Estadual MG Nº21972 de 21 de janeiro 2016) , do Projeto de Lei 654/15 o Senado, do Projeto de Lei 3.729/04 na Câmara de Deputados, e a proposta alteração da alteração da Resolução Conama 01/86 e 237/97, de autoria da Associação Brasileira de Entidades de Meio Ambiente (ABEMA).

A ABEMA é a associação dos órgãos licenciadores estaduais. Estas iniciativas estão deixando a sociedade preocupada pois são propostas que em seu princípio buscam: facilitar o licenciamento: redução da participação da sociedade; redução da interferências dos órgãos técnicos como os de defesa patrimônio; Indígenas e quilombolas; redução de prazos nas análises e dispensas de estudos técnicos como Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA); supressão de fases do licenciamento até mesmo para atividades de conhecida capacidade de degradação ambiental e risco social; centralização as decisões em órgãos licenciadores e ou comissões de fundo econômico em poder dispensar etapas do licenciamento de estudos técnicos; redução de parara estudos e pareceres; desconsideração de efeitos cumulativos de uma atividade numa região focando no licenciamento pontual desconsiderando a soma dos impactos negativos.
A continuar esta tendência, não teremos nem a joia nem a coroa e a sustentabilidade mais distante começará a se acostumar com “Marianas”.

Artigo escrito por: Procópio de Castro – Presidente do Instituto Guaicuy

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