01/12/2015
Dados sobre barragens da Samarco estão defasados desde 2012. Última informação sobre a represa que estourou indicava que estrutura acumulava 20 vezes menos rejeito.
Desde o ano de 2012, dados sobre a altura e o volume de rejeitos das barragens do Fundão e de Santarém, da Mina do Germano, da Samarco, em Mariana, estão defasados no cadastro de estruturas de represamento da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam). A represa de rejeitos do Fundão se rompeu completamente no último dia 5, e a lama que continha atingiu Santarém, que por esse motivo está em obras de reforço para impedir que também ceda. O acidente com os dois barramentos destruiu comunidades próximas, matou 13 pessoas, deixou oito desaparecidas, poluiu a Bacia Hidrográfica do Rio Doce e o mar capixaba. Altura e volume das barragens são componentes fundamentais para caracterizar o nível de risco que as estruturas apresentam, segundo as normas federais (Lei 12.334/2010 e Resolução CNRH 143/2012) e estadual (Deliberação Normativa 62/2002). Principalmente depois de os órgãos fiscalizadores das duas esferas governamentais admitirem que, devido ao número insuficiente de fiscais, as equipes priorizam vistorias onde os riscos são mais evidentes. A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável informou que os dados são repassados pela empresa por formulário, mas não sabe se as lacunas de estatísticas se deu por omissão da mineradora ou erro da secretaria em divulgá-las.
O último relatório que incluiu o volume de rejeitos do Fundão – até o desastre considerada uma estrutura segura – ocorreu em 2013. Naquele ano, constava no cadastro que a barragem comportava 2,65 milhões de metros cúbicos de areia, lama e detritos de minério. Contudo, a própria Samarco admitiu que um volume 20 vezes maior – 55 milhões de metros cúbicos – vazou da represa após sua ruptura. Santarém, que fica abaixo e retinha apenas água, aparece com 14,5 milhões de metros cúbicos até 2011, data da última atualização no sistema de controle estadual. Apesar de constar como saturada, a Barragem de Germano – também afetada e que passa por obras estruturais para impedir sua ruptura – consta com volume de 45 milhões de metros cúbicos no relatório de 2013, apesar de ter a capacidade de 70 milhões, volume que configura saturação.
No que diz respeito à altura das barragens, os dados também estão incompletos e os que existem são confusos. Para se ter uma ideia, em 2013, a altura de Fundão registrada no cadastro estadual era de 80 metros, enquanto técnicos do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) aferiram 130 metros em vistoria ao local. Santarém, que em 2009 passou de 29 metros para 53 metros, voltou a apresentar 29 metros em 2012 e depois subiu para 32 metros em 2013, sendo que nunca houve registros de redução do barramento ou de desabamentos antes do acidente.
A necessidade de abrir espaços para conseguir cumprir os contratos de fornecimento de minério, que representam mais rejeitos, sempre foi uma preocupação de primeira ordem para a mineradora, que tem dificuldade espacial e por isso lança mão de projetos audaciosos, segundo especialistas. “Na minha avaliação, a Barragem do Germano já estava saturada desde 2003 e, sem nenhuma obra de alteamento para ampliar a capacidade, já se tentava reduzir o volume dos rejeitos de uma forma que considero perigosa. Ao dizerem que está saturada agora, tenho minhas dúvidas”, afirma o engenheiro de minas e especialista em dragagem Maurílio Mansur. De acordo com ele, uma das soluções tentadas foi usar dragas para remover a lama do fundo de Germano para sete baias instaladas sobre o barramento. “A cada mês, enchíamos uma baia. A Samarco queria com isso que o material secasse e se compactasse, para liberar mais espaço. Só que 90% daquilo era areia, que não se compacta com a secagem. Não deu certo, mas deu para perceber essa ânsia. Uma barragem não se rompe no campo, mas no escritório”, disse.
Sobre as trincas e abatimentos nas estruturas de barramento de Santarém e Germano, admitidas pela mineradora após o desastre, Mansur acredita serem relativos a problemas na drenagem das represas, uma estrutura que serve para absorver a umidade que chega da extremidade onde o rejeito de minério é depositado. “Esse tipo de dano é bem característico. A filtragem dessa água deve ter falhado. Portanto, não adianta apenas reforçar, tem de reparar isso também”, afirma.
PLANO EMERGENCIAL O DNPM fez duas fiscalizações no complexo da Alegria, onde estão instaladas as barragens de Germano, Santarém e Fundão, em 2012 e 2013. Na primeira, os fiscais tiveram de elaborar um plano de segurança com inspeções de 15 em 15 dias e realizar um grande laudo anual em que constasse a situação de estabilidade das barragens. Segundo fontes do departamento, todas essas etapas foram cumpridas e uma declaração de estabilidade foi firmada por um engenheiro independente, com assinatura de responsabilidade técnica ligada ao Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG).
No ano seguinte, exigiu-se a formulação de um plano de ação emergencial para o caso de ruptura das barragens. De acordo com essas fontes do DNPM, a Samarco apresentou os planos, mas uma das linhas de investigação sobre o acidente apura justamente se as medidas foram postas em prática, o que até o momento ainda não foi confirmado. Nem mesmo pela empresa, que se limitou a declarar, por meio de seu presidente, Ricardo Vescovi, que o plano foi iniciado assim que ocorreu o rompimento, mas que o histórico do que foi feito ainda não foi esclarecido.
O Estado de Minas entrou em contato com a Samarco para que se pronunciasse sobre a falta de informações no cadastro de suas barragens, mas até o fechamento desta edição a empresa não se manifestou. Também não foi detalhado pela mineradora quais eram as etapas e procedimentos do plano de ação emergencial que deveria ter entrado em operação com o acidente.
Matéria veiculada pelo Jornal Estado de Minas em:
Postado em 01/12/2015 06:00 / atualizado em 01/12/2015 07:47
Jornalista: Mateus Parreiras