14/06/2021
A barragem Xingu foi colocada no nível 2 de alerta (segundo mais alto) pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e, embora não receba rejeitos de minério de ferro desde 1998, coloca em risco a vida de trabalhadores em atividade na Mina de Alegria
A Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) de Minas Gerais revelou, em nota divulgada na última quarta-feira, 9, que, de acordo com inspeção presencial ocorrida em 20 de maio e análise dos documentos apresentados pela Vale, a barragem Xingu não apresenta condições de estabilidade, com alguns fatores de segurança para situações não drenadas inferiores a 1, oferecendo risco significativo e iminente de ruptura.
Desde o dia 4 de junho, a Vale tinha informado a interrupção de atividades nos arredores da Barragem Xingu, na Mina Alegria, em Mariana, incluindo a paralisação da circulação dos trens do Ramal Fábrica Nova, da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), após notificação da SRTE. A interdição foi feita com base em leis trabalhistas.
A resposta da Vale sobre os impactos da interdição foi enviada à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e detalha que a notificação impedirá o escoamento da Usina Timbopeba e paralisará temporariamente a produção nesta unidade, com perda estimada em 33 mil toneladas de finos de minério de ferro por dia. Já referente aos acessos internos interditados na Mina Alegria, os impactos parciais estão estimados em 7,5 mil toneladas de finos de minério de ferro por dia.
Desacordo entre informações fornecidas pela Vale
Após a nota, a Vale voltou a reafirmar que não existe risco iminente de ruptura, já que não houve alteração nas condições ou nível de segurança da barragem de Xingu, que permanece em nível 2, segundo mais alto, do Plano de Ação de Emergência de Barragens de Mineração (PAEBM). Ainda reiterou que a barragem é monitorada e inspecionada por equipe técnica e continua incluída no plano de descaracterização de barragens da companhia. Além disso, alegou que a Zona de Autossalvamento (ZAS) permanece evacuada.
A barragem da região central mineira foi vistoriada em setembro do ano passado pela Agência Nacional de Mineração, que fez exigências e enquadrou-a como estrutura “a montante”, mesmo método de construção das barragens que se romperam em Mariana e Brumadinho. Anteriormente, ela era enquadrada como empilhamento drenado. A autarquia afirma que a Vale cumpriu algumas das exigências e pediu prorrogação de prazo em outras, e, desde então, não houve mudanças na estrutura. Esse sistema a montante pode explicar alguns dos dados técnicos revelados pela Superintendência.
A superintendência revelou que técnicos e engenheiros responsáveis pela barragem relataram que o rejeito lançado em Xingu não era drenado e era lançado desta mesma forma na estrutura. As paredes das barragens a montante são construídas sobre uma base de resíduos, em vez de em material externo ou em terra firme.
“Como a disposição de material no reservatório não era controlada é possível que tenha corrido o lançamento de camadas de material mais granular intercalado de camadas de material fino (pouco drenante), criando, o que foi chamado na barragem B1 de Córrego do Feijão, lençóis freáticos empoleirados. Tal situação aumenta a pressão no barramento e pode explicar os elevados níveis piezométricos medidos na estrutura, mesmo com um reservatório seco”, afirmou a Superintendência.
A situação coloca em risco grave os trabalhadores do entorno, justificando a interdição imposta pelo órgão trabalhista. Já a Vale, ignorando o risco iminente à vida, está tentando a retomada das atividades, “adotando medidas para continuar a garantir a segurança dos trabalhadores”. No fim de maio, a mineradora chegou a solicitar uma suspensão parcial da interdição, que foi negada.
Na edição 88 da revista Manuelzão, construímos um panorama sobre a negligência da Vale na reparação dos atingidos e na entrega dos reassentamentos 5 anos após a tragédia de Mariana. Leia a matéria Tragédia sem fim: cinco anos depois, Renova atrasa outra vez entrega de casas em Mariana, na página 16 da Revista Manuelzão 88.
A edição ainda conta com uma reportagem sobre o corte de verbas que o Ministério da Economia impôs à Agência Nacional de Mineração. O órgão é responsável por regular o setor minerário e fiscalizar as barragens de todo o país. Quatro barragens estão em nível 3 de emergência atualmente no estado e 45 em alerta. Leia a matéria Insegurança de Barragens: Governo Federal corta verbas para fiscalização e Minas convive com a iminência de novas tragédias na página 9 da Revista Manuelzão 88.