10/09/2021
Associação comunitária da Vila Betânia quer revitalizar, arborizar e devolver à comunidade uma das únicas áreas com cobertura vegetal na Região Oeste da capital
Uma área de proteção ambiental abandonada há 16 anos pelo proprietário e pelo poder público, às margens da Avenida Tereza Cristina, na Região Oeste de Belo Horizonte, pode finalmente ter seu devido valor reconhecido e ser transformada em um Parque Ecológico e Cultural. É o que desejam moradores e comerciantes da Associação de Moradores Empreendedores e Amigos da Vila Betânia (AME). A associação foi formada há três anos, entre outros motivos, com a intenção de assumir um compromisso do qual o poder municipal tem se ausentado: a gestão de um espaço de lazer, reserva ambiental e orgulho para a comunidade do entorno.
Trata-se o Recanto das Nascentes, uma área de quase 30 mil m² entre os bairros Vila Betânia e Vista Alegre, onde estão catalogadas nove nascentes; uma lagoa; três gameleiras, consideradas sagradas por religiões de matriz africana; inúmeras árvores típicas de Mata Atlântica, diversos animais silvestres e um espaço com quadras e equipamentos de lazer, atualmente degradados.
Para mudar esse jogo, a associação de moradores lançou uma campanha de financiamento coletivo, que chega a sua última semana, para revitalizar e arborizar o Recanto. A campanha é apoiada pelo Fundo Enfrente, para projetos sociais em periferias urbanas e, com isso, cada real doado é multiplicado por três. Contribua e ajude os moradores da região a reencantar o Recanto das Nascentes, a campanha tem menos de sete dias para bater sua meta de arrecadar 10 mil reais.
Uma foto da década de 70 mostra a exuberância que a área exibia no passado, com piscinas naturais, quadras esportivas e academia, quando era sede do antigo clube da Associação Cristã de Moços (ACM Recanto), que passou a ser uma pilha de entulho, lixo e abrigar mazelas sociais como drogas e prostituição.
O clube da ACM Recanto tinha uma grande importância social para a região, que é cercada por comunidades periféricas. Antes de abandonar a área em 2005 e o terreno ser penhorado, a ACM mantinha uma escola profissionalizante com cursos de marcenaria, eletrônica, datilografia, bombeiro hidráulico, corte e costura, salão escola, atendimento gratuito de dentistas e fisioterapeutas, como também uma Escola de Educação Infantil e inúmeras modalidades esportivas abertas à comunidade local.
Quando o terreno foi abandonado, ficou também à mercê da especulação imobiliária, o que permitiu a demolição das estruturas, soterramento das nascentes, queimada de árvores e despejo de dezenas de caminhões com entulho. Quem via o abandono não imaginaria que a área é considerada uma Área de Preservação Permanente (APP) pela Lei Nº 11.181/2019, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a biodiversidade, o solo e assegurar o bem estar das comunidades próximas.
A área também é frequentada por crianças e adolescentes que ainda nadam na lagoa principal, mas o abandono fez com que isso se tornasse um risco para os menores. A organização comunitária têm se mostrado como uma força contrária ao desejo que a periferia continue marginalizada, é o que afirma Gladson Reis, presidente da AME Vila Betânia: “acreditamos que o povo organizado pode levar a visão de termos um parque reconhecido com excelência no desenvolvimento humano, pelas atividades físicas, sociais, culturais, ambientais e humanistas”, afirma Reis.
“Por muito tempo fomos vistos de forma marginal e excluídos de políticas públicas mais amplas, mas a luta pela recuperação ambiental e social da Área de Proteção Permanente Vila Betânia tem demonstrado que nosso povo não perde a esperança e a ternura em nutrir sonhos e valores”, completa o líder da AME Vila Betânia.
O sonho dos moradores locais é mudar o estereótipo de terreno abandonado e transformar o Recanto das Nascentes em um Parque Ecológico e Cultural, resgatando espaços de convivência, de esporte, artes, lazer e agroecologia, onde pessoas de diversas idades possam se reconectar com a natureza, encontrar amigos, brincar com os filhos, cuidar da saúde, passear com seus animais de estimação e ter um espaço natural de bem viver dentro da cidade.
O Recanto das Nascentes, além disso, é uma das únicas áreas não pavimentadas e com cobertura vegetal na região da Avenida Tereza Cristina, conhecida pelas enchentes e inundações em épocas de chuva. “É urgente a remoção de entulho e desobstrução das canaletas de drenagem das nascentes, são essas canaletas que escorrem as águas para o rio Arrudas. Queremos romper a margem, esse patrimônio é da cidade, não somente da Vista Alegre e da Vila Betânia”, arremata Reis.
A campanha já recebeu apoio do Fundo Enfrente da plataforma Benfeitoria. Trata-se de um fundo colaborativo aberto para que pessoas físicas, empresas e instituições também se engajassem em causas e projetos estruturantes para as periferias urbanas do Brasil. Nasce então o Matchfunding, a cada 1 real doado, o Fundo Enfrente doa mais 2 reais. Se der “match” e a iniciativa bater a meta, ela recebe o triplo das doações. Caso contrário, o dinheiro é devolvido.
A mobilização dos moradores, contudo, começou bem antes do financiamento. “Há quatro anos, temos feito o movimento de devolver à sociedade aquela área, desde carnavais até mutirões, rifas, cerimônias religiosas, atividades culturais, esportivas e de educação ambiental. Mas o fato é que a justiça nos deu ‘uma Ferrari sem dinheiro para administrar’, são 29 mil m² de espaço. A comunidade tem participado dos mutirões de limpeza, centenas de crianças passam por lá por semana, para nadar, pescar, ‘matar aula’, brincar”, pontua Reis.
A primeira meta de investimentos de recursos envolve os serviços mais pesados de limpeza e adequação de segurança, que deveriam ser responsabilidade do poder público. Estão incluídos o aluguel de máquinas e caminhões para remoção de resíduos de construção civil que foram depositados indevidamente onde estão as quadras esportivas; contratação de profissionais para limpeza e recuperação das nascentes; instalação de portões sociais e futuramente guaritas; instalação de lixeiras e placas de educação ambiental; compra de ferramentas; limpeza do lago e recuperação da pista de caminhada de seu entorno.
Posteriormente, serão realizadas ações educativas como replantio de árvores e classificação das nascentes. Atualmente, o monitoramento ambiental das nove nascentes é feito em parceria com a Fundação SOS Mata Atlântica.
A campanha de financiamento está disponível até o dia 16 de setembro, próxima quinta-feira, no site da Benfeitoria. Independente do valor doado, os nomes serão homenageados nas redes sociais do Recanto das Nascentes. Entre as recompensas estão adesivos, canecas, ecobags, camisas, bloquinhos, travessias guiadas por Agente Socioambiental, banner na entrada com nomes dos parceiros, o seu nome como padrinho de uma das nove nascentes, um curso de educação ambiental para empresas e seu nome ou o nome da empresa no Parquinho Infantil de Eucalipto Ecológico. Ajude a reencantar o Recanto, seja um apoiador.