09/02/2022
Número é voltado ao compartilhamento de práticas docentes, experiências e reflexões críticas sobre o cotidiano de escolas em localidades impactadas pela atividade minerária
A Revista Brasileira de Educação Básica (RBEB) lançou, na última quinta-feira, 3, a edição especial Educação e Desastres Minerários, que reúne trabalhos de professores da rede básica de ensino, pesquisadores e ativistas da educação no âmbito da temática da mineração. O novo número tem como foco o compartilhamento de práticas docentes, experiências, reflexões e investigações críticas sobre o cotidiano e os desafios de escolas e localidades impactadas pela atividade minerária direta ou indiretamente.
O número foi organizado pela RBEB, junto ao Grupo de Pesquisa Educação, Mineração e Território (EduMiTe) e ao projeto de extensão Mapeamento e Visibilização de Práticas Didáticas e Desafios de Professores na Bacia do Rio Doce, Afetadas Pelo Rompimento da Barragem de Fundão da Samarco, vinculado ao programa Participa UFMG Mariana-Rio Doce.
Leia o editorial e os artigos da edição Educação e Desastres Minerários.
Entre os textos publicados, está Educação Ambiental em Desastres Minerários e Outros, do coordenador do Projeto Manuelzão, o professor Marcus Vinicius Polignano. O artigo aborda o cenário da mineração em Minas Gerais, com centenas de barragens em risco, “frutos de um modelo sistêmico que vem se repetindo ao longo da nossa história”. Polignano discute antecedentes da crise ambiental, o rompimento da relação homem-natureza, os laços entre educação e transformação cultural e, claro, a proteção das águas.
As pesquisadoras do EduMiTe, Roberta Araújo e Daniela Campolina, contribuíram com o artigo Mineração e Suas Controvérsias: Abordagem Didática Ciência-Tecnologia-Sociedade-Ambiente (CTSA). Nele, as autoras ressaltam a insegurança de barragens como uma controvérsia sociocientífica (CSC) que demanda dos professores e alunos um entendimento sobre a territorialidade da mineração, especialmente de seus impactos e riscos.
Também compõem a edição textos sobre mineração de lítio e processos político-educativos no Vale do Jequitinhonha, o uso de jogos e ferramentas digitais como recurso pedagógico na abordagem de conflitos socioambientais e controvérsias da mineração e um relato sobre práticas pedagógicas usadas com crianças órfãs de Brumadinho.
No último dia 3, uma roda de conversa de lançamento da edição especial foi transmitida em uma live no YouTube do EduMiTe. Na ocasião, as organizadoras, autoras e autores apresentaram ao público detalhes sobre o processo de elaboração do periódico e discutiram os temas da publicação. Confira abaixo:
Leia um trecho do artigo de Marcus Vinicius Polignano:
“Quando se conceitua e se estrutura um projeto de educação ambiental, pensa-se logo em crianças e escolas, como se fossem elas, necessariamente, os maiores agentes de transformação, diante da ação humana sobre o meio ambiente.
Na verdade, quando olhamos para o que ocorreu nos crimes minerários em Minas Gerais fica claro que os grandes responsáveis pelo processo estavam sentados nas cadeiras de escritórios de empresas e governos. Por vezes as próprias empresas patrocinam projetos de educação ambiental para as escolas e comunidades, enquanto suas práticas e ações vão na contramão do que é praticado nas comunidades. Estas mesmas empresas com as benesses da lei patrocinam projetos culturais, enquanto destroem patrimônios naturais e bens culturais. Portanto, qualquer discussão sobre educação ambiental tem que ser validada pela prática de quem a propõe, para que não seja e não pareça meramente estética. […]
Não há nenhuma incompatibilidade conceitual entre preservação e conservação dos ecossistemas naturais, bem como de biodiversidade, com a preocupação relativa ao aumento da qualidade e quantidade das águas enquanto insumo para a produção. Pelo contrário, o modelo da fratura conceitual e institucional que separa recursos hídricos de meio ambiente, que separa a água da vida na Terra, é absolutamente insustentável. E não é possível transigir com esta questão. Não há como fazer a gestão das águas como se fosse mero gerenciamento empresarial e administrativo de recursos hídricos, de massas d’água, de caixas d’água. A boa gestão, ao contrário, pode incorporar toda a sociedade, a educação ambiental, as paixões para soerguer o nosso país, com um novo imaginário de vida, solidariedade e cidadania.”