Estrutura de mina da Vallourec se rompe em Nova LimaProjeto Manuelzão

Estrutura de mina da Vallourec se rompe em Nova Lima

11/01/2022

Lama da mina Pau Branco interditou a BR-040, inundou centro do Ibama e unidades de conservação e seguirá curso do Velhas

No último sábado, 8, a duas semanas do crime da Vale em Brumadinho completar três anos, a BR-040 foi tomada pela lama do rompimento da pilha de estéril e o transbordamento de um dique/barragem de rejeitos da mina Pau Branco, da Vallourec. Na divisa entre Brumadinho e Nova Lima, na altura do quilômetro 562, a onda de lama deixou uma pessoa ferida, causou a remoção de moradores da região e de animais silvestres para o Centro de Reabilitação do Ibama, às margens da rodovia e deve alcançar a bacia do Rio das Velhas. Carros chegaram a ser carregados pela lama no momento do rompimento e a BR-040 ficou interditada até a manhã desta segunda, 10.

A estrutura da pilha de rejeito/estéril Cachoeirinha, na mina Pau Branco, da mineradora e siderúrgica francesa Vallourec, não suportou o volume de chuvas da última semana e se rompeu, causando o transbordamento do dique/barragem Lisa. As duas estruturas situam-se em Nova Lima, na microbacia do córrego Cachoeirinha, afluente do rio do Peixe. O Peixe é afluente do rio das Velhas e está localizado acima do ponto de captação de água da Copasa em Bela Fama, que abastece grande parte de Belo Horizonte e região metropolitana.

Caminhões limpam a sujeira da BR-040. A lama da Vallourec também atingiu unidades de conservação e um centro do Ibama. Foto: Bruno Costalonga Ferrete/Zimel Press

A pilha Cachoeirinha foi interditada pela Agência Nacional de Mineração (ANM), e a justiça determinou a suspensão de todas as atividades na Mina de Pau Branco e a execução de todas as medidas emergenciais previstas no Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM), apesar de ter negado o bloqueio de bens da Vallourec requisitado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). No domingo, 9, o dique Liso (chamado de barragem pela ANM) havia sido elevado para nível 3 de risco pela Agência, mas foi rebaixado para nível 2 por não haver “iminência de ruptura”.

Nesta terça-feira, 11, o governo do estado de Minas Gerais multou a Vallourec em R$288 milhões pelos danos ambientais – dentre eles, degradação da paisagem, fragmentação de habitats, poluição de corpos hídricos, potencial mortandade de peixes e supressão e degradação de habitats aquáticos e ripários.

Duas unidades de conservação da região foram afetadas: a Área de Proteção Ambiental Estadual Sul (APA Sul) da Região Metropolitana de Belo Horizonte e o Monumento Natural Municipal Serra da Calçada, em Nova Lima. 400 animais, entre mamíferos, aves e répteis, precisaram ser removidos do Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS) pelo Ibama, no sábado. Seis moradores da região próxima à mina Pau Branco também foram evacuados. Os rejeitos devem caminhar em direção à bacia do rio das Velhas, mas ainda não se sabe em que volume e velocidade.

Uma família que viajava para o Aeroporto de Confins morreu em um deslizamento de terra na Serra da Moeda, perto do condomínio Retiro do Chalé, em Nova Lima. Eles precisaram tomar um caminho alternativo devido ao bloqueio na BR-040 causado pelo rompimento na mina da Vallourec, no começo da tarde de sábado. As cinco pessoas que estavam no carro morreram.

No canto esquerdo inferior, um trator demonstra o tamanho da mancha de lama na mina Pau Branco, da Vallourec. Foto: Bruno Costalonga Ferrete/Zimel Press

Expansão licenciada em regime de urgência com apoio do governo estadual

O complexo Pau Branco foi ampliado há cerca de um ano, em regime de urgência, com apoio da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Semad) e do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). Segundo apuração do Observatório da Mineração, o licenciamento para a ampliação correu na modalidade concomitante – com Licença Prévia, de Instalação e de Operação ao mesmo tempo. Uma nova linha de distribuição de energia da Cemig foi construída para atender a mineradora.

A Vallourec pediu urgência para uma reunião extraordinária da Câmara de Atividades Minerárias (CMI) do Copam, que foi aprovada após recomendação da Semad, no dia 14 de janeiro de 2021. A empresa alegou que, se não fosse atendida nas primeiras semanas de janeiro de 2021, a produção precisaria parar porque a pilha de estéril já tinha alcançado o limite de área permitido – a vida útil da área atual é até 2028. No dia do rompimento, a mineradora afirmou que houve “carreamento de material sólido da pilha Cachoeirinha para o dique”.

Entidades ambientalistas se manifestaram contrárias à expansão deste então. Na CMI, o Promutuca se manifestou contrário ao licenciamento, mas perdeu para 14 votos favoráveis. O governador Romeu Zema (Novo) havia celebrado o projeto de expansão com a Vallourec dois dias antes do rompimento da barragem de Brumadinho, em 2019.

Lama do dique/barragem Lisa, da Vallourec. Foto: Bruno Costalonga Ferrete/Zimel Press

Tragédias da exploração predatória

Além da lama da Vallourec, o estado de Minas Gerais sofreu neste fim de semana com enchentes e inundações em centenas de municípios, principalmente na região central – em 138, até este domingo, foi decretado estado de emergência – como Brumadinho, Santa Luzia, Raposos, Nova Lima, Sabará, Congonhas, Barão de Cocais e São Joaquim de Bicas. Muitas pessoas precisaram deixar e perderam suas casas: segundo a Defesa Civil, até domingo, 3.374 pessoas estavam desabrigadas e 13.723 desalojadas. Em Belo Horizonte, mais uma vez a avenida Tereza Cristina foi interditada por inundações.

Em Pará de Minas, Pitangui e Onça do Pitangui, moradores foram evacuados após a barragem da Usina do Carioca, da Santanense, entrar em estado de alerta, com 99% de risco de rompimento, “a qualquer momento”. Em Capitólio, um deslizamento de rocha em cânion na Lagoa de Furnas deixou 10 mortos.

Enchente em Raposos, onde dois terços dos habitantes precisaram deixar suas casas. Reprodução: CBH Velhas/Marcos Neves – Marcos Produções

Em Congonhas, a justiça autorizou uso de força policial para fiscalizar danos em uma barragem da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) quatro vezes maior que a que se rompeu em Brumadinho. Com risco de rompimento desde domingo, até a noite desta segunda, 10, a CSN continuava a negar os problemas e impedir a fiscalização da barragem Casa de Pedra, que os moradores alertavam estar vazando, pela Defesa Civil. A estrutura fica acima de quatro bairros residenciais, onde mais de 2500 pessoas moram.

Um muro construído pela Vale em Macacos (São Sebastião das Águas Claras) ilhou o distrito de Nova Lima, onde a enchente não consegue escoar e obstrui pontes e vias de acesso. O distrito, que já vive em terror do rompimento da barragem há quase três anos, está ilhado sem nenhuma rota segura de fuga há mais de dois dias. Na manhã desta terça-feira, 11, um deslizamento de terra aumentou ainda mais o nível de lama que corre por Macacos. O muro de contenção é mais alto que um prédio de dois andares e foi construído pela Vale no curso do Ribeirão Macacos para conter possíveis rejeitos da barragem B3/B4, da Mina Mar Azul, em risco máximo de rompimento.

Descaso e conivência do governo estadual

Nesta segunda, o governador Romeu Zema (Novo) abriu uma reunião com os prefeitos das cidades mais atingidas pelos temporais no estado e a deixou minutos depois, sem anunciar nenhuma medida efetiva para mitigar prejuízos. Segundo reportagem d’O Tempo, não se falou sobre um plano de mitigação, como o governo pretende recuperar as estradas, auxiliar os desabrigados ou tomar qualquer tipo de medida emergencial.

Além disso, em entrevista coletiva em Capitólio, Zema disse que houve a “infelicidade de atingir uma lancha com dez pessoas” mas que o deslizamento foi inevitável, contrariando geólogos, como um “rolamento de pedra em estrada” ou a queda de um raio: “e se cai um raio, a culpa é do prefeito?”. O governador também atacou ambientalistas e os culpou pela crise hídrica e energética, falsamente relacionando a baixa de água na Lagoa de Furnas, o “baixo investimento em hidrelétricas” e o uso de combustíveis fósseis aos movimentos contrários aos impactos das construções de usinas e barragens no país.

Dois dias antes do crime de Brumadinho, o governador Romeu Zema (Novo) celebrou a expansão da mina Pau Branco, da Vallourec, que transbordou neste sábado. Reprodução: instagram

O Gabinete de Crise da Sociedade Civil – Plataforma de Informação e Justiça Socioambiental publicou, neste domingo, uma nota à sociedade mineira e à imprensa sobre o rompimento da Vallourec. Leia na íntegra.

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