Executivo de BH tenta realizar prova da Stock Car na Pampulha sem licenciamento ambiental - Projeto ManuelzãoProjeto Manuelzão

Executivo de BH tenta realizar prova da Stock Car na Pampulha sem licenciamento ambiental

20/02/2024

Secretaria de Meio Ambiente aponta que em função do corte de 73 árvores e do possível carreamento de óleo para a Lagoa da Pampulha evento demanda deliberação do órgão

A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), por meio da Superintendência da Capital (Sudecap), tenta emplacar a realização de uma etapa da corrida Stock Car, prevista para agosto deste ano, no entorno do Mineirão. Em janeiro a PBH abriu uma licitação, que teve vigência do dia 9 a 25, para os serviços de adaptação do entorno do estádio. Colocando o carro à frente dos bois, tudo isso foi feito sem a devida avaliação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA) dos impactos decorrentes da construção de um autódromo temporário no local.

Em um parecer assinado em 31 de janeiro, a equipe técnica da SMMA relata que recebeu para análise uma proposta da Sudecap de supressão de 73 árvores para a “montagem de circuito para a prática de automobilismo”. Avaliando a legislação, a equipe constatou que o Plano Diretor vigente determina o licenciamento ambiental de autódromos, hipódromos e estádios esportivos.

Porém ao consultar a Diretoria de Licenciamento de Empreendimentos de Grande Complexidade, os técnicos da SMMA foram informados que “as obras pretendidas não se caracterizam como autódromo, uma vez que a corrida da Stock Car será realizada somente uma vez ao ano, e assim o licenciamento desta será tratado na Subsecretaria de Regulação Urbana (Sureg), como licenciamento de evento”.

A análise da equipe técnica da SMMA conclui na contramão desse entendimento. No parecer, os técnicos “se manifestam desfavoráveis que a intervenção em espécimes arbóreos apresentada pela Sudecap seja analisada de forma isolada, sem considerar o licenciamento da corrida e os demais impactos que poderão ocorrer”. Eles recomendam que a demanda seja analisada e deliberada pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comam), vinculado à SMMA.

Entre os impactos negativos citados está a supressão de 73 árvores, sendo 54 espécimes nativos e 19 exóticos, entre os nativos, 14 ipês amarelos — por lei declarado de interesse comum, de preservação permanente e imune de corte. A justificativa também elenca a possibilidade do carreamento de óleo para a Lagoa da Pampulha, localizada a apenas 200 metros do local previsto para o circuito, e a produção de ruído muito acima do permitido logo em frente ao Hospital Veterinário da UFMG, o que pode causar estresse e até morte tanto dos animais que lá estejam, quanto os que habitam os fragmentos de mata existentes nas proximidades.

Os técnicos também apontam que não foram apresentadas justificativas para a escolha do local, nem alternativas locacionais onde não fosse necessária a supressão de vegetação.

Leia o parecer da equipe técnica da Secretaria Municipal de Meio Ambiente na íntegra.

Derrubada de árvores

Com a reforma do Mineirão realizada para a Copa do Mundo de 2014, o entorno do estádio perdeu à época 777 árvores. O parecer indica que, ainda que novos plantios tenham sido feitos como forma de compensação ambiental, grande parte das árvores hoje existentes foi plantada em 2013 ou em data posterior, “portanto ainda não tiveram tempo de se desenvolver plenamente”.

Para a realização da prova de Stock Car, seriam derrubados espécimes nativos, além de ipês-amarelo, de ipês roxo e rosa, paus-ferro, alecrins-de-campinas, que podem chegar a 25 metros de altura, oitis, saboneteiras, macaúbas, entre outros. Das espécies exóticas, destaca-se o ipê-rosado, o flamboyant e a tipuana. O parecer ressalta que alguns equívocos foram observados no levantamento arbóreo encaminhado pela Sudecap, principalmente, relacionados à identificação de ipês.

Os técnicos da SMMA retomam a literatura da área para indicar que a arborização urbana gera vários benefícios como melhor permeabilidade do solo, diminuindo o escoamento superficial; conforto térmico e luminoso aos seres vivos; filtragem dos raios solares, diminuindo os efeitos provocados pelo excesso de radiação; proteção contra ventos e ruídos; diminuição da poluição atmosférica, retendo particulados em suspensão do ar, sequestrando e armazenando carbono, um dos gases de efeito estufa. Também são destacados os valores estéticos e ornamentais.

O maior impacto em relação ao corte das árvores, é apontado no documento, seria na Avenida Coronel Oscar Coelho onde seriam retiradas 43 árvores, entre elas dez ipês-amarelos, “deixando sem árvores um vão muito grande no passeio”.

Os técnicos também verificaram “que o circuito previsto para realização da corrida é, também, classificado como Conexão Verde, que visa interligar zonas de preservação ambiental e áreas de diretrizes especiais ambientais, visando à melhoria da arborização urbana e à formação de corredores ecológicos”.

Impactos negativos à fauna

Previsto para apenas 200 metros de distância da Lagoa da Pampulha, o circuito da prova pode agravar a contaminação da lagoa e de toda a cadeia trófica existente. Isso porque é esperado um aumento de liberação de óleos a montante de lagoa, que em caso de uma limpeza não efetiva, serão carreados dentro dela. No local, um canal revestido na confluência das Avenidas Presidente Carlos Luz e Rua Alfredo Câmara é “um sinal de alerta” para possível contaminação por óleo da área da lagoa.

O monitoramento de fauna local indicou que 191 espécies que utilizam a lagoa como abrigo e área de vida, sendo 11 espécies de mamíferos, 149 de aves, 18 de anfíbios e 13 de répteis.

Já o ruído gerado pode chegar até a 110 decibéis, 40 decibéis a mais do que o permitido pela lei municipal em período diurno e 50 a mais que o permitido no período da tarde. “Entende-se que a fauna local naturalmente procure abrigo em dias de evento em porções vegetadas mais distantes das vias a serem utilizadas”, argumenta-se no parecer, “porém quando existe uma fragmentação de vegetação, o poder de dispersão da fauna se torna limitado”.

A proximidade da via a ser utilizada pelo circuito na Avenida Presidente Carlos Luz, em frente ao Hospital Veterinário da UFMG, “é provavelmente o ponto mais crítico a ser relacionado com os impactos do ruído que será causado pela corrida. Essa porção é mais sensível por se tratar de um local de tratamento médico veterinário e haver poucas árvores que permitam um mínimo de isolamento acústico. Faz-se necessário lembrar que os animais ali em tratamento possuem uma acuidade auditiva muito superior à dos seres humanos, sendo que os limites permitidos para pessoas não se aplicam a animais”.

A reunião do Conselho Municipal do Meio Ambiente

Nesta quarta-feira, 21, às 13h30, o Comam se reunirá virtualmente para deliberar sobre o corte das 73 árvores, e movimentos ambientalistas da cidade cobram que o conselho convoque o autódromo da Stock Car para o licenciamento ambiental, além da apresentação de alternativas locacionais por parte dos proponentes da prova.

A participação é aberta à sociedade civil. Interessados podem se inscrever para falar através deste link, escolhendo o item 4.2 da pauta de reunião.

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