30/07/2024
Com apoio do governo estadual, mineradora ré na Justiça Federal e autuada 17 vezes obteve anuência para atuar às margens do Rio das Velhas
Texto atualizado na segunda-feira, 5 de agosto de 2024, às 16h28.
“Podemos falar que uma palavra que sintetiza tudo seja ‘inadmissível’”. Assim o coordenador do Projeto Manuelzão, Marcus Vinicius Polignano, descreve a decisão do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) de aprovar o pedido de licença de operação da mineradora Fleurs Global às margens do Rio das Velhas, na divisa entre Raposos, Nova Lima e Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
A anuência ignora 17 autuações por crime ambiental da mineradora. Apenas o representante do Instituto Heleno Maia de Proteção à Biodiversidade (IHMBio) votou contra, em reunião da Câmara de Atividades Minerárias (CMI) realizada no último dia 26. Os outros nove conselheiros presentes votaram a favor da licença de mineração, enquanto dois se abstiveram.
Polignano questionou a decisão da CMI do Copam, dado o histórico de descaso, exploração ilegal e até mesmo ameaças de um sócio da empresa à secretária estadual de Meio Ambiente. “Como uma empresa que faz tudo errado, com todos os autos de infração, ameaças recentes à secretária, com a realização de audiências públicas onde foram feitos diversos questionamentos sobre a operação e nenhuma resposta foi dada e ainda assim o licenciamento foi votado e aprovado?”
Fora as 17 acusações de crime ambiental que a empresa coleciona, o sócio da mineradora, o ex-deputado estadual João Alberto Paixão Lages, foi indiciado pela Polícia Civil por coação e injúria à secretária de Meio Ambiente, a quem chamou de “ilustre secretária de merda nenhuma” e exigiu que o processo de licenciamento, este aprovado agora, fosse acelerado.
Lages é sócio da mineradora Gute Sicht, que explorou uma área próxima à da Fleurs na Serra do Curral, também sem licenciamento ambiental. A Polícia Federal aponta, desde 2020, que as empresas, na verdade, são a mesma. Fleurs e Gute disfarçavam a extração ilegal de minério como trabalhos de terraplanagem, além de beneficiarem e comercializarem o material com uma guia de utilização concedida ilegalmente pelo ex-diretor da Agência Nacional de Mineração (ANM), Guilherme Santana Lopes Gomes.
Lages, o ex-diretor da ANM e as mineradoras são alguns dos réus no processo que corre na Justiça Federal. A denúncia do Ministério Público Federal aponta, entre outros crimes, extração ilegal de minério, usurpação de bens da União e lavagem de dinheiro. O órgão cobra a aplicação de uma multa de R$ 50,7 milhões para a reparação dos danos ambientais causados apenas entre fevereiro e julho de 2020.
O Instituto Guaicuy protocolou um mandado de segurança contra a Feam na tentativa de retirar o processo de pauta, porém a votação seguiu normalmente. A entidade afirma que houve uma violação significativa do processo administrativo devido à falta de respostas a mais de setenta questionamentos submetidos durante uma audiência pública.
Na CMI do Copam, o histórico de decisões favoráveis à mineração salta aos olhos. Uma análise mostrou uma razão de 95% de aprovação de licenças aos empreendimentos, com placares em geral de 10×2, 9×3 e 8×4. A aprovação da licença soma mais uma determinação que favorece a empreendimentos do tipo no estado.