Menos de um ano após sua aprovação, lei Mar de Lama Nunca mais é violada - Projeto ManuelzãoProjeto Manuelzão

Menos de um ano após sua aprovação, lei Mar de Lama Nunca mais é violada

17/01/2020

Anglo American consegue autorização para expansão de projeto de barragem; Há mais de dez anos na cidade de Conceição do Mato Dentro, as atividades da mineradora são permeadas por críticas e prejuízos à população local

No fim de dezembro de 2019, projeto da Anglo American de ampliação da sua barragem no município mineiro de Conceição do Mato Dentro foi aprovado pelo Conselho de Política Ambiental, vinculado à Secretaria de Estado de Meio-Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. A licença veio mesmo com comunidades vivendo abaixo da estrutura, na área denominada de “autossalvamento”, onde não teriam tempo de se salvar em caso de rompimento. A lei veda a concessão de licença ambiental para a construção, instalação, ampliação ou alteamento de barragem nessas circunstâncias.

O Gabinete de Crise Sociedade Civil (GCSC) preparou uma reportagem, em três partes, abordando a atuação da Anglo American em Conceição do Mato Dentro e a série de abusos da mineradora na região com a expansão de seus empreendimentos. Confira a primeira parte:

Anglo American e o longo histórico de abusos em Conceição do Mato Dentro

A Anglo American instalou-se no município mineiro de Conceição do Mato Dentro em 2008. Nos últimos anos, com o processo de expansão da atividade da mineradora, houve uma escalada nos conflitos entre a população e o empreendimento.

Em dezembro do ano passado, a Secretaria de Estado de Meio-Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), desrespeitando a lei Mar de Lama Nunca Mais, concedeu licença para nova expansão das atividades da mineradora. A licença veio mesmo com comunidades vivendo abaixo da estrutura, na área denominada de “autossalvamento”, colocando em risco a vida da população local. Os abusos da mineradora na região e a inércia dos órgãos reguladores, entretanto, vêm de longa data.

Rompimentos do mineroduto
No fim de 2014, a Anglo American iniciou as operações do seu projeto Minas-Rio, para levar o minério da mina do Sapo em Conceição, até o Porto do Açu, em São João da Barra (RJ). O mineroduto que liga esses pontos tem 529 quilômetros, o que o coloca como o maior do mundo e atravessa 33 municípios mineiros e fluminenses. Do Porto de Açu, o material é despachado para a China.

No dia 12 de março de 2018, o mineroduto rompeu-se em Santo Antônio do Grama, cidade de quatro mil habitantes na Zona da Mata mineira. Segundo a Agência Brasil, 474 toneladas de polpa de minério de ferro contaminaram o ribeirão Santo Antônio até sua desembocadura no rio Casca.

A captação no ribeirão foi interrompida e o abastecimento foi realizado por caminhões pipa durante três dias. O ribeirão Santo Antônio foi atingido em todos seus 21 quilômetros de extensão, segundo o Estado de Minas. Para que os moradores não ficassem sem água fontes alternativas de captação precisaram ser estabelecidas. Ainda assim, logo no dia 27 de março, com permissão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o mineroduto foi reaberto.

Apenas dois dias depois, um novo vazamento, a 240 metros de distância do primeiro, despejou mais 647 toneladas do material. Pelos dois vazamentos, a mineradora britânica foi multada por poluição e degradação ambiental em R$125,5 milhões pela Semad e R$ 72,6 milhões pelo Ibama.

Série de violações
Os danos causados pela Anglo American às populações próximas dos empreendimentos da empresa, entretanto, não se restringiram aos vazamentos do mineroduto. As famílias que residem em Conceição do Mato Dentro, desde o início do projeto Minas-Rio convivem com falta de água, inclusive para consumo.

O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), com base em diagnósticos, trabalhos acadêmicos e visitas à região, moveu uma ação contra a mineradora em 2018, uma semana antes dos vazamentos. Na denúncia, o órgão público alega que a operação do Minas-Rio provocou uma ruptura no modo de vida das pessoas e das comunidades. O MPMG aponta impactos como o aumento da violência, escassez de água, elevação repentina do número de habitantes, destruição de vias urbanas e rurais, poluição, desagregação social e cultural e queda na geração de renda do ecoturismo.

De acordo com os dados apresentados, a Mina do Sapo – origem do minério da Anglo American extraído na região – usa 2,5 mil metros cúbicos de água limpa por hora, o suficiente para abastecer uma cidade de 220 mil habitantes. Segundo a ação, os impactos no fornecimento de água ocasionaram a falta de perspectiva para famílias de produtores rurais que, sem água de qualidade, tiveram suas atividades agrícolas interrompidas.

Ainda segundo os promotores, na implementação do projeto, a Anglo American comprou propriedades rurais omitindo o potencial minerário do local e ocultando seus planos, para adquiri-las por preços mais baixos.

O histórico de desrespeito às populações também virou livro, publicado pelo programa Polos de Cidadania, da Faculdade de Direito da UFMG. “Violações de direito e dano ao projeto de vida no contexto da mineração”, foi lançado em março de 2018.

Na segunda parte dessa reportagem, o GCSC abordará as ameaças de morte sofridas por cinco moradores de Conceição que ingressaram com uma ação popular contra a expansão das atividades da Anglo American. Também lembraremos as denúncias de uso de trabalho escravo pela mineradora na região.

Imagem: Reprodução/WhatsApp

 

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