14/11/2025
Evento realizado às margens do Velhas reúne ambientalistas, gestores públicos e comunidade para firmar pacto pela recuperação da bacia
As margens do Rio das Velhas em Santa Luzia foram palco, nesta quarta-feira, 13, do lançamento da Meta 2034. Conduzido pelo embaixador da iniciativa, o médico sanitarista e professor Apolo Heringer Lisboa, idealizador do Projeto Manuelzão, em parceria com o prefeito Paulo Bigodinho, o evento marcou um passo decisivo de uma nova etapa da luta pela recuperação ambiental da bacia.
O encontro reuniu a equipe e representantes dos núcleos do Projeto Manuelzão, integrantes do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Velhas), representantes das prefeituras de municípios do epicentro da degradação e movimentos ambientalistas, além de estudantes, moradores e imprensa.
A Meta 2034 estabelece um compromisso de longo prazo: até 2034, os peixes nativos devem retornar ao Velhas, indicador máximo da saúde hídrica e da qualidade ambiental da bacia. O plano aposta em ações combinadas, fiscalização eficiente e, principalmente, coordenação integrada entre instituições para reverter décadas de degradação.

Apolo Heringer Lisboa, idealizador do Projeto Manuelzão, discursa sobre a relevância da Meta 2034 diante da crise ambiental. Foto: Enaile Almeida/Projeto Manuelzão.
A escolha do município como sede da articulação pela Meta não é casual. O município faz parte do epicentro da degradação do Velhas, que vai da foz do Itabirito à foz do Ribeirão da Mata, entre Vespasiano e Santa Luzia. Um dos trechos mais críticos da bacia, fortemente impactado pelo lançamento de esgotos domésticos, comerciais e industriais, o epicentro ainda abrange Caeté, Contagem, Belo Horizonte, Itabirito, Nova Lima, Raposos, Rio Acima, Sabará e os dez municípios da sub-bacia do Ribeirão da Mata.
Historicamente penalizado pela poluição metropolitana, Santa Luzia pode agora protagonizar a virada ambiental que a bacia precisa e restaurar as relações de pertencimento com o Velhas. “Essa região, durante centenas de anos, viveu do rio”, lembrou Apolo. O documento-base da proposta estabelece que a recuperação deve priorizar a área drenada pelas fozes dos ribeirões Arrudas, Onça e da Mata – região que concentra 85% da população, do Produto Interno Bruto (PIB) e os impactos mais severos da metrópole.
A Meta 2034 rompe com a gestão fragmentada que tem perpetuado a crise ambiental e defende um pacto coletivo como única estratégia efetiva. A ampliação do saneamento, restauração de matas ciliares, renaturalização de trechos degradados e combate à poluição difusa compõem o conjunto de ações previsto pela proposta. Cada município envolvido terá responsabilidades diretas no planejamento integrado, no saneamento, na redução da poluição e na adequação dos planos diretores às diretrizes da bacia.
“A gestão de uma bacia não é a soma de gestões municipais, mas o cumprimento coletivo de um objetivo único”, reforçou Apolo, defendendo um novo modelo de governança em que municípios, comitês de bacia, órgãos ambientais e sociedade civil atuem de maneira integrada. Ao comentar os desafios políticos e técnicos, o professor foi enfático: a Meta 2034 exige coragem institucional e o rompimento com práticas protelatórias que têm adiado a solução do problema.
A iniciativa propõe revisar a lógica econômica da bacia. Apolo defende uma nova cobrança pelo uso da água que inclua danos às águas superficiais e subterrâneas, pontuando o risco hídrico crescente na Região Metropolitana de Belo Horizonte. “A escassez está sendo paga pela população nas tarifas, não é possível que atividades de grande impacto paguem tão pouco pela água bruta”, criticou. “O que regula a vida do rio é a água subterrânea, que gera as nascentes. Essa seca subterrânea é produto humano, produto de uma política econômica ineficaz”.
Segundo dados do Fórum Permanente São Francisco (FPSF), a bacia do rio das Velhas perdeu 13,6% de vazão nos últimos 26 anos, volume que poderia abastecer toda a região metropolitana durante pouco mais de 15 anos. O levantamento do projeto “De olho no Velhas” identificou a mineração como uma das principais causas da redução.

Prefeito de Santa Luzia se compromete a concentrar esforços para cumprir a Meta 2034. Foto: Bruno Pereira/Projeto Manuelzão.
O prefeito de Santa Luzia, Paulo Bigodinho, destacou o papel do município como articulador regional e assumiu o compromisso de cobrar a retirada dos esgotos que ainda chegam ao leito do Velhas na cidade, além da universalização do tratamento. Para ele, a Meta 2034 também carrega um valor simbólico fundamental: “É devolver às pessoas a capacidade de acreditar.” Paulo declarou que a cidade está pronta para unir municípios, mobilizar a sociedade e acompanhar cada etapa da renaturalização. “Recuperar o Rio das Velhas é recuperar a história e o futuro de Minas”.
A Meta 2034 representa uma oportunidade histórica de resgatar o sentido público das águas e de construir, coletivamente, um futuro em que o Rio das Velhas volte a ser fonte de vida, identidade e dignidade para todos os mineiros. A volta do peixe, além de um indicador ambiental, é o símbolo da capacidade humana de reverter a destruição e de construir um futuro em que o bem-viver seja uma realidade para todos os seres que habitam a Terra.
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As fotos são de Bruno Pereira e Enaile Almeida.