MPF pede suspensão imediata das licenças ambientais concedidas à Tamisa - Projeto ManuelzãoProjeto Manuelzão

MPF pede suspensão imediata das licenças ambientais concedidas à Tamisa

23/06/2022

Ação movida pelo órgão aponta que empreendimento minerário ameaça modo de vida da comunidade quilombola Manzo Ngunzo Kaiango

O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com uma Ação Civil Pública (ACP) com pedido de tutela de urgência contra o Estado de Minas Gerais e a mineradora Tamisa. A ACP solicita que a Justiça Federal declare nulas as licenças ambientais concedidas à mineradora para a instalação do Complexo Minerário Serra do Taquaril (CMST), na Serra do Curral, e que as atividades da empresa na região sejam suspensas imediatamente.

De acordo com o MPF, a instalação do CMST impacta diretamente a comunidade quilombola Manzo Ngunzo Kaiango, que não foi previamente consultada. Devido a isso, o órgão federal considera o licenciamento desrespeitoso por descumprir obrigações assumidas pelo Estado brasileiro, que prevê o direito à consulta prévia, livre e informada.

Makota Cássia Kidoialê, líder do quilombo, declarou ao Observatório da Mineração tratar-se de um genocídio cultural: “Não tem outro nome para isso. O nosso modo de vida vem a partir da nossa cultura. É o que nos sustenta, nos alimenta, é o que nos mantém. As nossas expressões culturais, históricas e os ritos sagrados dependem de toda essa vegetação”.

O projeto de exploração minerária da Tamisa é classificado como de Grande Porte e Grande Potencial Poluidor, com o segundo maior potencial de degradação possível em sua classificação. Segundo a ACP, o empreendimento possui potencial de impacto no território quilombola, que enquanto comunidade culturalmente diferenciada, depende da região para suas práticas e usos tradicionais.

“A instalação do Complexo Minerário Serra do Taquaril viria afetar de modo direto a comunidade quilombola de Manzo, reconhecida como patrimônio cultural imaterial protegido pelo município de Belo Horizonte e pelo estado de Minas Gerais e uma das quatro comunidades quilombolas autorreconhecidas e certificadas pela Fundação Cultural Palmares na capital mineira”, declara o procurador Edmundo Antonio Dias na ação.

A comunidade de Manzo soube da concessão de licença ambiental à Tamisa por meio da imprensa, sendo surpreendida pela notícia. Até então, não foram consultados nem pela empresa, nem por órgãos públicos.

“Ela ignorou tanto que nós não existimos nos documentos do licenciamento. Eles apagaram a gente ainda aqui. E é justamente por isso, para não ter que consultar. Sempre denunciamos esse interesse minerário na Serra do Curral e as pessoas diziam que era impossível. Agora aconteceu. E estamos sofrendo esse apagamento cultural e essa violação de direitos”, denuncia Makota Cássia.

O quilombo Manzo Ngunzo Kaiango

Comunidade do quilombo Manzo Ngunzo Kaiango reunida. Imagem: Iepha

“O nosso passado já cantava o nosso presente. E quando a gente canta no presente é um canto de cuidado e de preservação para o futuro” – Makota Cássia Kidoiale, do quilombo Manzo Ngunzo Kaiango.

A Comunidade Manzo Ngunzo Kaiango foi fundada na década de 70 e, em 2017, foi registrada como Patrimônio Cultural Imaterial de Belo Horizonte. Em 2018 a comunidade quilombola foi também reconhecida como Patrimônio Cultural do estado de Minas Gerais, na categoria de lugares, com respaldo do Dossiê de Registro da Comunidade Quilombola Manzo Ngunzo Kaiango, elaborado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha).

O quilombo Manzo é considerado como grupo culturalmente diferenciado, ou seja, que possui formas próprias de organização social e que ocupam e utilizam o território e seus recursos naturais como “condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”, de acordo com a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, instituída pelo Decreto no 6.040, de 2007.

A comunidade possui  práticas sociais e culturais específicas ligadas à religiosidade de matriz africana e possui sua identidade indissociável ao território, visto como vital para o grupo. A vulnerabilização desta região afeta o próprio direito à existência da comunidade Manzo Ngunzo Kaiango.

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