Opinião: O lixo

26/04/2011

Mobilizador do Projeto Manuelzão reflete sobre como lidar com o lixo

Há algum tempo, ninguém percebia que ele existia. Era esquecido nas latas, nos cantos, abandonado. Agora ficou famoso, todo mundo fala nele. Aparece na TV, nos jornais, vira até capítulo de livro! Ele deve estar na maior exibição, orgulhoso. De que estou falando? Do LIXO, oras.

Lembro-me do meu avô. Acabava o almoço ou o jantar, a minha avó chamava a empregada e falava: vem tirar os pratos sujos da mesa, por favor! Ele ficava na maior braveza:

_ Já falei um montão de vezes! Os pratos não estão sujos. Estão u-sa-dos!
Tinha toda razão, o meu avô. Ninguém come sujeira, assim, nada ali estava “sujo”. E foi exatamente isso que aconteceu com o nosso lixo. De repente alguém olhou para ele e descobriu que ele não era sujo. Era só… um pouco “usado”. Nós, os humanos, somos seres muito esquisitos. Veja se foi isso que aconteceu: um dia, jogamos no rio uma garrafa plástica de refrigerante. Bom, ficamos anos e anos olhando para ela, coçando a cabeça, esperando para ver o que acontecia. Nada, ela continuou boiando, tranquilamente. Consultamos então os técnicos, que disseram que ela demorará mais de cem anos para se desintegrar. Levamos um susto. Ó, cem anos ou mais? Já estaremos mortos, temos que fazer alguma coisa! Para que ela pode servir? E assim concluímos, com cara de gênios da lâmpada: já sei! Ela pode servir para …..colocar refrigerante!

Sinceramente, não sei o que passa na nossa cabeça. Agora tem essa montoeira de lixo no mundo e ninguém sabe o que fazer. Como juntamos tanto lixo? É que misturamos as coisas que sobram, sem critério. Não entendo. Antes de ser “lixo”, tudo na nossa vida é separado e catalogado, com o maior cuidado. Ninguém, quando chega do mercado, mistura arroz com embalagem de shampoo, com pó de café e laranja e papel higiênico, tudo embolado numa lata. Arrumamos tudo caprichadinho, guardamos o feijão na lata, o açúcar no açucareiro, as frutas na fruteira.

Mas depois que consumimos e as coisas perdem o conteúdo, não valem mais nada. Somos uns tremendos de uns consumistas-egoístas-bagunceiros. A casca de banana, as sementes, o osso de frango, a casca de ovo. Aproveitamos o melhor e passamos a ter nojo, aflição e desprezo pelo resto, chamando-o de “lixo”. Depois, as embalagens. Essas são as “roupas” dos nossos produtos. Sem elas, eles se sujariam, se contaminariam, estragariam. As embalagens protegem. E ser uma embalagem é uma espécie de… ato de amor. E como retribuímos com quem acolhe nosso alimento? Eca, lixo! 

Estou exagerando né? Está certo, mas não podemos esquecer que tem lixo que é lixo mesmo, e que removê-lo da cidade é uma questão de saúde pública. E vamos olhar com outros olhos o que chamamos de “lixo” pois o que vem da natureza, para lá deve voltar; e o que vem da indústria, para ela deve retornar.
Quando nos falam tanto de “RE”, na reciclagem, reutilização e redução, acho que temos que ouvir outras palavras: retorno, realidade, resgate, resolução, retribuição, responsabilidade e recompensa. Afinal de contas, hoje em dia, o lixo é respeitável!



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