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Porteiras abertas para os agrotóxicos

19/01/2021

Governo libera 493 agrotóxicos em 2020, bate o próprio recorde alcançado em 2019 e consolida o Brasil como um dos principais destinos de químicos perigosos

O governo do presidente Jair Bolsonaro bateu o recorde de registros de novos agrotóxicos no país, com 493 venenos agrícolas liberados em 2020. O número foi atingido neste dia 11 de janeiro, quando o Ministério da Agricultura publicou no Diário Oficial da União a liberação de 56 agrotóxicos para o uso dos agricultores; a divulgação se referia aos últimos registros autorizados em 2020.

Segundo o ministério, são 37 agrotóxicos químicos e 19 biológicos, que são aqueles que podem ser utilizados tanto em lavouras comerciais quanto na produção de alimentos orgânicos. A legislação brasileira considera como agrotóxico tanto produtos biológicos utilizados na agricultura orgânica quanto químicos utilizados na produção convencional.

Dessa última leva de aprovações do ano passado, 5 agrotóxicos são inéditos e 51 são genéricos, isto é, cópias de produtos inéditos e que podem ser produzidas por mais empresas quando caem as patentes.

Entre os agrotóxicos inéditos, quatro deles são formulados a partir do químico tolfenpirade, que é, ao mesmo tempo, um inseticida, acaricida e fungicida usado para o controle de pragas que sugam a seiva da planta. Outro químico inédito é o piroxasulfone.

Uma reportagem da Agência Pública e do Repórter Brasil aponta que a empresa japonesa Nichino será responsável por produzir e comercializar quatro produtos à base de tolfenpirade. O químico foi classificado pela Anvisa como altamente tóxico e está aprovado para culturas de tomate, trigo, algodão, repolho, maçã, alface, entre outras.

Já o herbicida piroxasulfona será o princípio ativo de cinco novos produtos, que poderão ser utilizados nas culturas de cana-de-açúcar e eucalipto. A empresa detentora dos registros é a Iharabras, também do Japão.

Os dois agrotóxicos foram aprovados nos Estados Unidos, mas não são permitidos na União Europeia.

No Brasil, a liberação de novos agrotóxicos é avaliada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Ministério da Agricultura e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Explosão de registros

O Ministério da Agricultura começou a compilar os dados de registro de venenos agrícolas em 2005. Desde então, dois momentos podem ser claramente distinguidos. O primeiro, vai de 2005 a 2015, o segundo, de 2016 a 2020.

Nos primeiros 11 anos da compilação, a liberação de agrotóxicos teve como número mínimo 89 registros, em 2005 e como máximo, 202, no ano de 2007. A média de agrotóxicos registrados por ano, durante tal período, foi de pouco mais de 140 novos registros.

A partir de 2016, uma nova abordagem dos governos vem se desenhando e recordes de liberação foram quebrados ano após ano: em 2016, foram 277 novos registros, em 2017, 404 registros, em 2018, 449 registros e em 2019, 497 novos agrotóxicos foram registrados no país.

Dos mais de 3 mil produtos agrotóxicos comercializados no Brasil, quase um terço, ou 967 pesticidas, recebeu registro durante os dois anos de governo Bolsonaro, que tem à frente do Ministério da Agricultura a ex-líder da bancada ruralista na Câmara, Tereza Cristina.

Governo tentou liberação automática de agrotóxicos

O Ministério da Agricultura chegou a tentar, por meio da Portaria 43, editada em fevereiro de 2020, a aprovação tácita de agrotóxicos e fertilizantes químicos após prazo 60 dias do início do processo junto à pasta.

Segundo a regra do Ministério da Agricultura, finalizada as análises técnicas realizadas pelo MAPA, Ibama e Anvisa, o processo de registro dos agrotóxicos teria que ser concluído em até 60 dias. Caso o prazo fosse excedido, o agrotóxico seria liberado automaticamente.

A medida foi derrubada em junho do ano passado por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). O relator da ação, ministro Ricardo Lewandowski, disse que a liberação “indiscriminada de agrotóxicos” poderia levar “perigo de grave lesão à saúde pública”.

No último dia 11, o Ministério da Agricultura revogou a Portaria 43 e apresentou nova Portaria 196, que define níveis de classificação de risco para as atividades que dependem de aprovação prévia e retira da lista de aprovações tácitas aquelas relacionadas ao registro de agrotóxicos e fertilizantes.

O que diz a Anvisa?

Em nota, a Anvisa atribuiu a “vazão de demanda reprimida” os recordes anuais de aprovações que os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro vem batendo, adicionando que “muitos desses processos já haviam sido analisados pelo Ibama e pelo Ministério da Agricultura, e aguardavam apenas o resultado da Anvisa para que o registro fosse publicado”.

A agência reguladora alegou ainda que as aprovações não significam um maior consumo de agrotóxico, mas sim uma “maior concorrência e redução do preço para o produtor rural. […] Esses produtos são de venda restrita, mediante recomendação de profissional habilitado, por meio do receituário agronômico”.

Segundo a Anvisa, um terço dos produtos registrados no último ano utilizam ativos biológicos, microbiológicos, extratos de plantas e outros ingredientes ativos sustentáveis.

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