SANEAMENTO NO BRASIL – POSSIBILIDADE OU UTOPIA?

11/02/2011

Artigo de José Nelson de Almeida Machado, Engenheiro Sanitarista e ambiental, representante da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária no CBH Velhas.

As pessoas com mais de 50 anos
freqüentemente lamentam sobre o fato de que em sua infância, os rios eram mais
limpos e tinham peixes. Essa afirmativa seria mero saudosismo na base do
“antigamente a vida era melhor” ou seria uma efetiva constatação da
realidade?  Infelizmente esta é a
realidade de nossos recursos hídricos, com raras exceções.  Praticamente em todas as cidades brasileiras,
a construção dos serviços de esgotamento sanitário, quando estes existem, não
contemplava o tratamento de tais resíduos. 
Isto significa que não se cogitava de interceptar os esgotos coletados e
convergi-los para um ponto determinado onde seria instalada a Estação de
Tratamento, cumprindo-se assim o ciclo completo.

Até 1970 os serviços de saneamento não
tinham planejamento definido e nem disponibilidade de financiamento adequados.
Algumas cidades conseguiam verbas, mas mesmo assim esbarravam em dificuldades
operacionais. Com o advento do PLANASA – Plano Nacional de Saneamento, naquele
ano foram criadas linhas de financiamento a partir do FGTS. No entanto, as
carências eram tão grandes que foi necessário priorizar a aplicação dos
recursos para o abastecimento de água que era mais urgente. Isto fez com que o
Brasil se encontre atualmente numa situação próxima à universalização quando se
trata do serviço de abastecimento de água, mas num déficit abissal quando se
trata de coleta e principalmente tratamento de esgotos urbanos. Com o aumento
da quantidade de água disponível por habitante e os esgotos lançados
diretamente nos cursos d’água, a degradação dos córregos e rios piorou a olhos
vistos. E num prazo relativamente curto.

As pessoas se habituaram, de longa data, a
lançarem os seus resíduos no solo, redes de águas pluviais e nas vias públicas
e naturalmente não pagarem por isto. Esta situação acabou resultando num
comportamento paradoxal das pessoas com relação ao meio ambiente, pois embora
não haja quem não deseje os rios limpos, há uma resistência muito grande para a
adesão ao sistema público devido ao incremento que ocorre na conta mensal de
água quando se acrescenta o custo do serviço de esgoto.

Esta situação ficou muito bem evidenciada
na pesquisa “Percepções sobre Saneamento Básico” feita pelo IBOPE e Instituto
Trata Brasil em junho de 2009. Foram entrevistadas 1008 pessoas em 67 cidades
com mais de 300.000 habitantes. Os resultados mostraram que 31% das pessoas não
sabem o que é saneamento básico e 41% não se dispõem a pagar para ter os
serviços de esgotamento sanitário. Segundo um ranking de importância dos
serviços públicos na percepção dos entrevistados, o fornecimento de água é a
primeira necessidade; em segundo lugar vem o acesso à luz e só então vem os
serviços relacionados ao esgoto, ganhando apenas para os de telefonia.    

Este conjunto de fatores faz com que a
precariedade dos serviços de esgotos não venha encontrando uma disposição firme
dos governos municipais e das populações no sentido de eliminar ou reduzir este
grave passivo ambiental. Isto gera o retorno de doenças, mau cheiro e lama, e assim,
todo o cuidado com o meio ambiente desenvolvido pelo projeto fica prejudicado.
Um fato a ser destacado é que as concessões de sistemas de esgotamento às
companhias estaduais são em número insignificante em relação às concessões dos
serviços de abastecimento de água. Em Minas Gerais, a COPASA possui cerca de 610
concessões de abastecimento de água e pouco mais de 160 de esgotamento
sanitário.

Podem-se desenvolver várias discussões sobre tais
resultados, principalmente pelo fato de que todas as pessoas querem um meio
ambiente limpo e saudável. O problema é que o desinteresse das populações pelos
sistemas de saneamento pauta o comportamento dos gestores públicos que acabam
priorizando outros serviços, muitas vezes de vantagens discutíveis.

As cidades que se destacam no ranking do saneamento têm uma
característica comum: há anos o saneamento é prioridade em seu plano diretor e
os investimentos são regulares, independentemente do órgão operador – seja ele
privado, municipal ou estadual. “O planejamento local e a prioridade às
questões ambientais são fundamentais para os avanços” diz Gesner Oliveira,
presidente da SABESP (Revista Exame, 20/05/2009).

 Em sistemas providos de Estações de Tratamento de Esgoto
(ETE’s), é freqüente que estas fiquem ociosas, devido aos problemas apontados
acima. Outro risco grave decorrente desta negligência refere-se a alguns tipos
de resíduos tóxicos de empreendimentos comerciais e industriais situados na
área urbana, como galvanoplastia, laboratórios fotográficos e radiológicos,
postos oficinas mecânicas, etc., sobre os quais não incide qualquer tipo de
controle. Nas localidades desprovidas de ETE’s, a prestação dos serviços de
esgotamento sanitário resume-se à manutenção das redes de coleta. Não há
qualquer controle sobre os efluentes tóxicos de atividades industriais, que
podem ser carreados ao corpo receptor. Mesmo em algumas localidades providas de
ETE’s, o seu controle costuma ser apenas dos processos internos operacionais.

Caso ocorra a presença de compostos tóxicos no lodo, e se
este for levado para aplicação agrícola, o risco para as pessoas que o
manipulam e para o meio ambiente é igualmente grave. Para prevenir tal situação,
a COPASA criou o PRECEND – Programa de Recebimento de Efluentes Não Domésticos,
mas a sua aplicação ainda está restrita aos poucos sistemas concedidos à mesma.

Não basta ter recursos financeiros suficientes, é necessário um intenso
trabalho de mobilização e sensibilização das comunidades e dos gestores
públicos para que os serviços de esgotamento sanitário consigam deslanchar. jnam@uai.com.br

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