15/06/2022
Decreto representa mudança de tom do governo, que após forte pressão popular reconhece publicamente a importância da serra, mas não garante sua proteção integral
O governo de Minas Gerais assinou um decreto que reconhece a Serra do Curral como “bem de relevante interesse cultural”, nesta terça-feira, 14. O decreto estabelece, em seu artigo 2º, que a serra poderá “a critério dos órgãos e entidades responsáveis pela política ambiental e de patrimônio cultural do Estado, ser objeto de proteção específica, por meio de inventário, tombamento, registro ou de outras iniciativas e procedimentos administrativos pertinentes, conforme a legislação aplicável…”.
O reconhecimento do patrimônio, já tão afirmado por movimentos ambientalistas, pela comunidade acadêmica, por órgãos e conselhos patrimoniais e pela população da Região Metropolitana de Belo Horizonte, pode ser uma ação preliminar em relação ao tombamento efetivo da serra, mas não tem valor de proteção.
Embora se trate de um avanço importante, o decreto ainda é insuficiente, e não resta outro caminho para a proteção integral da serra – se o governo realmente assim deseja – a não ser seu tombamento estadual, o que a resguardaria em Belo Horizonte, onde a serra já é tombada, e estenderia a proteção às suas porções em Nova Lima e Sabará.
O decreto foi anunciado um dia após o adiamento da discussão da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que tramita na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) pelo tombamento estadual da serra. A PEC 67/2021 foi criada porque o processo de tombamento tradicional, através do Conselho Estadual de Patrimônio Cultural (Conep), é travado pelo próprio governo estadual.
Segundo Jeanine Oliveira, ambientalista do Manuelzão, em entrevista ao portal BHAZ, o executivo estadual teve várias oportunidades de proceder com o tombamento da Serra do Curral e não o fez; agora, cada vez mais pressionado, “instrumentaliza a pauta com fins eleitoreiros”. Ela lembra também que, com o decreto, é apenas reconhecida a importância do patrimônio da serra, portanto não há um avanço real no tombamento integral. Além disso, não foi definido o perímetro de incidência do decreto.
De acordo com normativa interna do próprio Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha), a medida de proteção provisória da Serra do Curral agora requerida por Zema já poderia ter sido tomada pelo órgão sem provocação ou autorização do governador, bastando que ficasse comprovado “risco ou ameaça ao bem cultural”, como é o caso do Complexo Minerário Serra do Taquaril (CMST), projeto de exploração da Tamisa que o governo apoia fervorosamente.
Especialistas do Gabinete de Crise da Sociedade Civil afirmam que, por isso, a serra já poderia estar protegida. Além disso, tendo em vista a tramitação da PEC na ALMG, a ação de Zema também tem como objetivo “passar por cima” do que já se avançou em relação ao tombamento.
Todos os membros do governo do estado no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) votaram a favor do projeto de mineração da Tamisa na serra, aprovado no dia 30 de abril.
A comissão especial responsável pela análise da PEC 67/21 iria votar o relatório da proposta na noite de anteontem, segunda-feira, 13. Após a aprovação do parecer, a pauta estaria pronta para ser votada em 1º turno no plenário da Assembleia. No entanto, as discussões emperraram.
Defensores da Serra do Curral se reuniram na manhã de terça-feira, 14, às portas da ALMG em protesto contra a retirada de pauta da PEC 67/21. Os ativistas levantaram faixas e cartazes nas escadarias da sede do legislativo estadual, para pressionar os parlamentares contrários à PEC e reafirmar a luta contra a exploração da Serra do Curral.
Será realizada uma audiência pública na ALMG na próxima segunda-feira, 20, às 9h, para debater novamente o projeto de tombamento da Serra do Curral. O texto possui assinatura de 30 dos 77 deputados estaduais, sendo cinco destes parte da Comissão Especial. A deputada Ana Paula Siqueira (Rede) e o deputado Osvaldo Lopes (PSD) são presidente e vice e a deputada Beatriz Cerqueira (PT) é relatora. Além destes, também fazem parte o autor da proposta, Mauro Tramonte (Republicanos) e Gustavo Santana (PL). Santana foi o único a não assinar a PEC.