Audiência pública sobre terminal de minério em Bação é canceladaProjeto Manuelzão

Após ação judicial do Manuelzão, audiência pública sobre terminal de minério em Bação é cancelada

15/03/2024

Decisão em 1ª instância reconheceu irregularidades, mas foi revertida pelo presidente do TJMG minutos após horário previsto para o início da audiência

A audiência pública referente ao licenciamento ambiental do Terminal Ferroviário Bação (TFB) prevista para a última quarta-feira, 13, às 19h, não foi realizada após o Projeto Manuelzão conseguir, na véspera, 12, uma decisão judicial pelo seu cancelamento. A Bação Logística tenta instalar um terminal de minério em São Gonçalo do Bação, distrito de Itabirito, a 70 quilômetros de BH. A ação acatada pela juíza Vânia da Conceição Borges aponta irregularidades na anuência concedida ao empreendimento pela Prefeitura de Itabirito e na convocação da audiência.

A liminar concedida, às 19h50 de terça, foi revertida pelo presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), desembargador José Arthur Filho, às 19h21 de quarta, minutos depois do horário de início previsto para a audiência, após recurso da Prefeitura de Itabirito. Após a indefinição, a audiência foi então cancelada pelos representantes da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Semad), órgão responsável pela tramitação do licenciamento.

Integrantes da Associação Comunitária de São Gonçalo do Bação, coautora da ação movida pelo Projeto Manuelzão, afirmam que a empresa, mesmo sabendo da decisão então vigente, passou a quarta-feira anunciando a audiência, deslocou para o local do evento parte da comunidade (toda vestida com camisas azul-turquesa com a sigla TFB inscrita) e acusou membros da Associação de divulgarem notícias falsas, induzindo parte da população interessada a desacreditar dos efeitos da liminar.

Pessoas deslocadas pela Bação Logística para local da audiência. Foto: Reprodução.

O Projeto Manuelzão continuará questionando na Justiça a legalidade da Certidão Municipal de Conformidade concedida pela Prefeitura de Itabirito ao empreendimento e o consequente reagendamento da audiência.

Antecessores

Desde 2018, a Bação Logística tenta implantar um terminal ferroviário  a menos de 1000 metros do centro do distrito de São Gonçalo do Bação, fundado em 1740 durante o início do povoamento de Minas Gerais. Moradores foram surpreendidos pelo trabalho de máquinas no local, que causou o assoreamento de ao menos duas nascentes, além do despejo de lama diretamente no Ribeirão Carioca e nas cachoeiras Bem-Vinda e Três Quedas, na Bacia do Rio Itabirito, afluente do Velhas.

O distrito também tem bens materiais e imateriais tombados na esfera municipal e federal e em processo de análise na estadual. Entre eles estão a Igreja Matriz, construída em 1924 servindo-se da estrutura da capela erguida em 1740 (atual sacristia da Matriz) na fundação do arraial, e o Grupo de Teatro do Bação.

À época, a Bação Logística valia-se de uma Licença Ambiental Simplificada, em função de o projeto ter sido classificado, inicialmente, como “pátio de estocagem”, e não como um terminal de carga de minério, de impacto muito maior e que não pode ser autorizado de forma simplificada. Após a Associação Comunitária de São Gonçalo do Bação apontar tais irregularidades ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), uma ação judicial paralisou as obras e resultou na obrigação do cumprimento do licenciamento adequado.

Numa escala de impacto que vai de 1 a 6, o empreendimento foi reclassificado de 2 para 4.

Novo projeto, velha anuência

Enfrentando resistência, a empresa optou por arquivar o pedido de licenciamento em 2022. No ano seguinte, deu entrada em um novo pedido de licenciamento, desta vez obrigada a apresentar à Semad o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), diagnóstico técnico exigido a empreendimentos degradadores. Contudo, a Bação Logística manteve no novo processo a mesma Certidão Municipal de Conformidade obtida junto à Prefeitura de Itabirito à época da classificação errônea do impacto do TFB.

A manutenção dessa anuência é questionada na Justiça pelo Projeto Manuelzão e a Associação de Moradores. Na petição ajuizada pelo Núcleo de Direito Ambiental do Projeto Manuelzão, os advogados argumentam que “a Certidão está sendo aplicada para um requerimento de Licença Ambiental que envolve um projeto distinto, respaldado por técnicos diferentes e com uma área de abrangência maior, pontos não abordados na primeira.”

Problemas na audiência

Os advogados também sustentam que a realização da audiência pública, decorrente da certidão de conformidade irregular, afronta o devido processo administrativo, que “estabelece as etapas procedimentais do licenciamento de forma cronológica, não podendo ser invertidas ou dispensadas pelos órgãos ambientais estaduais, municipais ou pelos empreendimentos. A realização da audiência pública sem a apresentação da Declaração de Conformidade adequada viola as etapas anteriores […]”.

Ainda de acordo com os argumentos na petição, a Bação Logística não respeitou o prazo de 15 dias úteis entre o requerimento da audiência pública e sua realização. Esse argumento foi acatado pela juíza Vânia da Conceição Borges, da 1ª Vara Cível, Criminal e da Infância e da Juventude de Itabirito.

A decisão foi, contudo, revertida pelo presidente do TJMG, sob a justificativa de “resguardar a ordem pública, em sua dimensão administrativa […]”, prossegue o desembargador em outro trecho, “cabendo às autoridades municipais e estaduais, bem assim ao juiz natural, zelarem pelo fiel cumprimento da legislação ambiental que rege a matéria.”

O Núcleo de Direito Ambiental do Projeto Manuelzão, junto à Associação Comunitária de São Gonçalo do Bação, continuará questionando na Justiça a Certidão Municipal de Conformidade concedida ao empreendimento e a realização de audiência pública sem a devida regularização do ato administrativo.

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