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Cinco anos do crime da Samarco no Rio Doce: tragédia está longe do fim

05/11/2020

Crime se perpetua no desrespeito às populações atingidas, na degradação não reparada do meio ambiente e na contaminação por metais pesados de solo e água da bacia do Rio Doce

O rompimento da barragem da Samarco, no distrito marianense de Bento Rodrigues, completa cinco anos neste dia 5 de novembro. A tragédia-crime, entretanto, se perpetua na forma desrespeitosa com que as empresas envolvidas têm atuado em tanto em relação às pessoas atingidas quanto à bacia do Rio Doce, que segue contaminada da região próxima ao rompimento até sua foz, no mar de Regência, Espírito Santo.

Segundo a Cáritas, organização que atua na Assessoria Técnica Independente dos atingidos de Mariana, até mesmo na região que foi o epicentro do desastre mais de 90% da população atingida ainda não foi indenizada pelas perdas e danos sofridos. Os poucos que foram chamados para negociar receberam propostas irrisórias de indenização pela Fundação Renova, da Vale, que pressiona pela assinatura de acordos e se vê no direito de calcular o valor do sofrimento, das perdas e dos danos materiais e imateriais das pessoas atingidas.

Na reparação ambiental, segundo um relatório do Ministério Publico Federal de novembro de 2019, somente 2,6% dos rejeitos da bacia foram retirados e 35% do orçamento destinado a esse fim foi gasto.

Todos os responsáveis estão livres da acusação de homicídio das 19 vítimas do rompimento e aguardam julgamento em liberdade. Samarco, suas proprietárias Vale e BHP Billiton e a empresa de engenharia VogBr, além de nove pessoas, responderão apenas por inundação qualificada.

Moradias provisórias

A Samarco já recebeu licença para voltar a operar em Mariana, mas nem mesmo as moradias das 402 famílias que perderam suas casas e terrenos para a lama foram entregues ainda. Existia uma previsão de conclusão dos reassentamentos coletivos para março de 2019, tendo sido prorrogado para agosto de 2020, depois novamente para fevereiro de 2021, e, no momento, aguardamos mais um cronograma de obras atualizado.

Ainda segundo a Cáritas, a morosidade se agrava com as alterações arbitrárias nos projetos e obras das casas, entraves na compra de imóveis, recusa na possibilidade de execução de obras por autogestão, além da proposição de terrenos com áreas inferiores e características diferentes às situações de origem, que trazem problemas de acessibilidade, mobilidade, perda de espaço para produção agrícola e pecuária ou mesmo para construção.

Contaminação por metais pesados

O que há muito tempo é uma realidade para a população de Barra Longa e distritos marianenses foi confirmado pelo Estudo de Avaliação de Risco à Saúde Humana (ARSH), divulgado no último ano: poeira e solo da região estão contaminados por metais pesados. Foram observadas concentrações danosas à saúde de cádmio, níquel, zinco e cobre. A concentração de cádmio, metal cancerígeno, foi 17 vezes superior à margem de segurança. Estudos de pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) também constataram a contaminação de água e pescado na foz do Rio Doce, no mar de Regência.

O ARSH foi realizado em Barra Longa e seus distritos Barretos, Mandioca, Gesteira e Volta da Capela, e nos distritos de Bento Rodrigues, Camargos, Ponte do Gama, Paracatu de Baixo, Paracatu de Cima, Pedras, Borba e Campinas, pertencentes a Mariana. Mais avaliações seriam realizadas nos municípios de Rio Casca, Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado, Governador Valadares e no Mar de Regência, mas até então estão suspensas, pois a Renova iniciou uma briga judicial contestando a metodologia do estudo.

Em 2017, 11 pessoas já haviam sido diagnosticadas com intoxicação por níquel em Barra Longa, em exames providos numa iniciativa do Instituto Saúde e Sustentabilidade. Elas desenvolveram problemas respiratórios, na pele e transtornos mentais – parte dessas pessoas precisará de acompanhamento clínico periódico até o fim da vida.

Postura desrespeitosa da Renova

Enquanto a população contaminada adoece, a Renova afirma que os moradores de Barra Longa só serão considerados como atingidos se comprovarem ligação entre os problemas de saúde e o rompimento. As pessoas atingidas afirmam estar desamparadas e deixadas à própria sorte.

Juristas criticaram a posição afirmando que o ônus da prova deve ser de quem causou danos, apontando também a disparidade no poder entre as pessoas atingidas, que precisam se defender, e as mineradoras.

A Fundação Renova, criada para tratar da efetividade e da celeridade das reparações, contesta estudos, oferece acordos irrisórios às pessoas atingidas e realizou poucas ações práticas para as populações do Rio Doce. Propagandas nas principais emissoras de TV e veículos de imprensa tomam o lugar de medidas de prevenção e atenção.

 

Foto: Fred Loureiro/Secom-ES

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