11/02/2022
Deputado insiste na defesa de interesses das grandes mineradoras e tenta aproveitar regra de tramitação mais célere para assuntos relacionados a Covid-19
Menos de uma semana depois de retirar da tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) o Projeto de Lei (PL) 3.209, que flexibiliza a Lei Mar de Lama Nunca Mais, o deputado estadual Virgílio Guimarães (PT) apresentou outra proposta com a mesma finalidade. O PL 3.497, apresentado na ALMG na manhã desta sexta-feira, tem as mesmas definições de seu antecessor, retirado de pauta após uma onda de indignação e ampla mobilização contrária, mas é ainda pior. Nesse falso recuo, considerações sobre a pandemia que não têm relação alguma com o tema foram incluídas, aproveitando a regra de tramitação mais célere para assuntos relacionados a Covid-19, e são previstas diferentes situações em que o estado abre mão de processos regulatórios em relação a barragens.
A Lei 23.291, conhecida como Mar de Lama Nunca Mais, instituiu a Política Estadual de Segurança de Barragens e criou dispositivos fundamentais como a proibição de barragens a montante; instituiu o prazo para descomissionamento de barragens desse tipo até 2022, exigiu mais rigor para o descomissionamento de barragens e proibiu a presença de pessoas na chamada Zona de Autosalvamento (ZAS), aquela em que não há tempo suficiente para intervenção dos serviços e agentes de proteção civil em caso de rompimento.
Mas nem todos os seus pontos foram regulamentados e o estado já descumpriu a lei ao aprovar a ampliação de uma barragem a montante da Anglo American, em Conceição do Mato Dentro.
A proposta do deputado insiste na defesa dos interesses das grandes mineradoras em detrimento à segurança da população mineira, em especial comunidades que vivem perto dessas inúmeras estruturas e os trabalhadores da atividade minerária. Alegando dar mais “rigor e clareza na segurança de barragens”, a proposta visa, por exemplo, ampliar o prazo para descaracterização de barragens de rejeitos a montante. Na prática, a ampliação do prazo abre margem para elas jamais sejam descomissionadas.
Também continua permitindo que projetos de mineração com tratamento a seco passem pelo Licenciamento Ambiental Concomitante (LAC), em que as licenças prévia, de instalação e operação são concedidas ao empreendedor de uma só vez, sem que haja tempo para a devida fiscalização e acompanhamento das atividades. Nos casos de disposição a seco de rejeitos, método que supostamente substitui barragens por pilhas de estéril ou cavas, e do aproveitamento desses rejeitos, um novo artigo também autoriza a concessão de licença ambiental na modalidade LAC.
O artigo vale até 31 de dezembro de 2023 ou enquanto durar a pandemia de Covid-19. Além de usar da pandemia para o rito da ALMG, como foi mencionado, a data de 2023 pode estar relacionada à tentativa de licenciamento do Projeto Apolo, da Vale, enorme empreendimento que ameaça a Serra do Gandarela.
Uma nota pública contra o primeiro projeto apresentado pelo deputado Virgílio Guimarães foi assinada por mais de 120 organizações, movimentos e mandatos e 2,5 mil pessoas. A mobilização de todos foi uma resposta clara da sociedade de que não irá permitir que a Mar de Lama Nunca Mais, conquistada a duras penas e a lamentáveis perdas, sofra (ainda mais) retrocessos. Agora, o PL está sendo analisado por especialistas para averiguar a extensão do retrocesso que Virgílio Guimarães tenta passar na ALMG.