20/03/2024
Decisão também determina suspensão de pedido de licenciamento da empresa e bloqueio de R$ 30 milhões por danos ambientais
A Justiça acatou, nesta quarta-feira, 20, a ação movida pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) que pedia a suspensão das atividades da mineradora Fleurs Global, que há anos atua próximo à Serra do Curral, às margens do Rio das Velhas, na divisa entre Raposos, Sabará e Nova Lima, na Grande BH. A decisão também determina a suspensão do licenciamento ambiental solicitado pela mineradora e o bloqueio de R$ 30 milhões de suas contas bancárias para assegurar a reparação dos danos ambientais.
A sentença é da juíza da 2ª Vara Cível da Comarca de Nova Lima, Maria Juliana Albergaria Costa. Ela atende parcialmente à ação civil pública (ACP) movida pelo MPMG na segunda-feira, 18, que pede ainda o descomissionamento do empreendimento. Cabe recurso da decisão.
Sem licença ambiental, a Fleurs instalou-se de forma irregular na área em 2018, de cara suprimindo 28 hectares de vegetação de galeria de Cerrado e Mata Atlântica. À época, a mineradora também foi autuada por intervenção em Área de Preservação Permanente (APP), captação irregular de recursos hídricos, assoreamento de curso d’água, descumprimento de embargos administrativos, entre outros delitos. Ao todo, a empresa foi autuada 17 vezes.
Mesmo assim, em julho de 2019, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad) assinou com a Fleurs um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), instrumento precário de regularização das operações utilizado no lugar do processo de licenciamento ambiental. Enquanto a empresa era investigada pela Polícia Federal e se tornou ré na Justiça Federal, esses acordos foram sucessivamente renovados pelo órgão estadual, até que o último termo vigente venceu no dia 23 de fevereiro deste ano.
A empresa mantém atualmente duas unidades de tratamento de minérios e uma pilha de disposição de rejeitos, em uma área de 80 hectares, bem ao lado do Rio das Velhas.
Professor da Faculdade de Medicina da UFMG e coordenador do Projeto Manuelzão, Marcus Vinícius Polignano comemorou a medida, “apesar de tamanha demora”, e espera que o MPMG e a Justiça, “seguindo o mesmo caminho, também suspendam as atividades da Empabra [mineradora que atualmente tem permissão para comercializar minério previamente lavrado na Serra do Curral]”.
A ação movida pelo MPMG vem no bojo das ameaças do empresário e ex-deputado João Alberto Lages à secretária estadual de Meio Ambiente, Marília Carvalho de Melo, para “acelerar” o licenciamento ambiental solicitado pela Fleurs. Os áudios com as ameaças vieram à público no último dia 4. Lages é sócio da Fleurs e presidente da recém-formada Associação de Mineradoras de Ferro do Brasil (AMF).
Segundo o inquérito da Polícia Civil, Lages pressionou Marília para que ela acelerasse o licenciamento ambiental da planta de beneficiamento de minério da Fleurs Global na divisa entre Raposos, Sabará e Nova Lima, na Grande BH, ao pé da Serra do Curral e ao lado do Rio das Velhas. As mensagens foram enviadas nos dias 23 e 24 de dezembro, após uma audiência pública vinculada ao processo não ser realizada no dia 23. A audiência foi realizada no dia 7 de fevereiro.
Além da ação pedindo a suspensão das atividades da Fleurs, o MPMG anunciou abertura de inquérito contra Lages. Em um áudio de um minuto de duração, o minerador diz: “Ô, ilustre secretária de merda nenhuma, é João Alberto que tá falando. Aqui, cê para de bandidagem, de tentar extorquir a [Fleurs] Global no nosso licenciamento”.
A Polícia Federal aponta, desde 2020, que a Fleurs Global e a Gute Sicht, mineradora que atuava em área próxima na Serra do Curral (também por meio de TACs), agiam em conluio. Fleurs e Gute ocultavam a extração minerária ilegal como ações de terraplanagem e beneficiava e comercializava o material com uma guia de utilização concedida ilegalmente pelo ex-diretor da ANM, Guilherme Santana Lopes Gomes.
Lages, o ex-diretor da ANM e as mineradoras são alguns dos réus no processo que corre na Justiça Federal. A denúncia do Ministério Público Federal aponta, entre outros crimes, extração ilegal de minério, usurpação de bens da União e lavagem de dinheiro. O órgão cobra a aplicação de uma multa de R$ 50,7 milhões para a reparação dos danos ambientais causados apenas ente fevereiro e julho de 2020.