29/04/2022
Manifestantes protestam contra o projeto do complexo minerário da mineradora Tamisa, que será avaliado hoje pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam)
Movimentos sociais de Belo Horizonte e da região metropolitana desfilaram pelas ruas da capital nesta quinta-feira, 28, em um bloco de carnaval em defesa da Serra do Curral, cartão postal da cidade, ameaçado pela atividade mineradora. Vestidos de verde, os participantes da folia percorreram as ruas do Centro portando cartazes com uma mensagem muito clara: queremos nosso patrimônio de pé.
A manifestação carnavalesca foi organizada pela coalizão Tira o Pé da Minha Serra. O grupo reúne ativistas, movimentos sociais, mandatos e organizações da sociedade civil que buscam dar um basta à constante exploração daquilo que é um dos maiores patrimônios culturais e paisagísticos da Região Metropolitana de Belo Horizonte.
A folia reuniu diversos blocos e agremiações carnavalescas que, unidas, tocaram suas baterias pelo patrimônio cultural do município, entoando o verso “Salve a Serra”. A concentração começou às 16h20, na Praça Raul Soares, reunindo milhares de pessoas.
Os manifestantes ressaltam a importância de colocar o bloco na rua e dar lugar à voz da população contra a exploração desenfreada do meio ambiente. A data escolhida para o evento foi muito significativa: nesta sexta, o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) avalia a proposta de instalação do Complexo Minerário Serra do Taquaril, da Tamisa (Taquaril Mineração S.A).
Apolo Heringer, professor da Faculdade de Medicina da UFMG e fundador do Projeto Manuelzão, discursou na concentração: “Estão desrespeitando a cidadania de Minas Gerais. As pessoas estão perdendo suas casas nas regiões de território de mineração, estão desvalorizando os imóveis. Compraram tudo, condomínios inteiros para poderem minerar. E eles não se importam com a Serra do Curral, com o Taquaril, eles não se preocupam que a poeira vai chegar na cidade toda. Todas essas casas, o hospital da Baleia, vão receber a poeira da mineração, e vão transformar num inferno a vida na região. Eles dizem que nós somos radicais, nós precisamos ser radicais sim!”.
Os manifestantes alertam para os riscos que a Tamisa traz com seu complexo minerário, que incluem: destruição da área verde, poluição nas áreas próximas, poluição sonora, riscos ao abastecimento hídrico da região, destruição dos sítios ecológicos e ameaça a espécies endêmicas. Os impactos à região são muito severos e podem destruir o que resta da Serra do Curral.
“Essa tarde é uma tarde de vigília. Amanhã eles querem aprovar a destruição da Serra do Curral, a destruição do patrimônio de todo o povo mineiro, que é a Serra do Curral, patrimônio da cidade de Belo Horizonte” afirmou Bella Gonçalves, vereadora de Belo Horizonte. “A serra, para nós, vale muito mais que qualquer coisa, vale mais que o minério, que inclusive não vai deixar nada para a gente. Vai secar os rios, vai gerar poeira, não vai gerar nada bom para o nosso povo”.
Os inúmeros cartazes espalhados por toda a manifestação carregavam mensagens similares, como “Prioritário é o Tombamento”, “Me Salve da Tamisa e da CMI/Copam”, “Supri/Semad Assassina de Serras” e “Tira o Pé da Minha Serra”, hashtag oficial do movimento que alcançou, nesta semana, milhares de compartilhamentos e mensagens de apoio.
“A mineração em Minas Gerais não é só uma atividade econômica, é uma ideologia. A ideologia da mineração está fossilizada no nosso imaginário. Há uma ideia mentirosa, falaciosa, de que nós dependemos da mineração. E isso é mentira. (…) Nós vamos combater a mineração enquanto atividade econômica e vamos combater a mineração enquanto ideologia. E isso se inicia emergencialmente em derrubar de vez esse processo de mineração ilegal, criminoso, ecocida e também genocida chamado Taquaril Mineração” declara Duda Salabert, vereadora do município.
A defesa pela Serra do Curral é dificultada por diversos entraves que, ano após ano, permitem que a região permaneça vulnerável às ameaças da exploração predatória. O tombamento estadual é essencial para garantir que ameaças como a da Tamisa não voltem a acontecer, e que a integridade da serra seja preservada.
A Serra do Curral já é tombada no âmbito federal e municipal. No entanto, esses tombamentos protegem apenas as porções da serra nos limites de Belo Horizonte e não são suficientes para impedir a retirada de ferro longe da vista dos moradores de BH, em seus 11 quilômetros de extensão, onde a serra compreende também parte do território de Sabará e Nova Lima. Dessa forma, diversos trechos importantes e repletos de riquezas permanecem desprotegidos.
O Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais produziu um dossiê com mais de 1600 páginas, financiado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), fundamentando a enorme importância do tombamento estadual imediato da serra. No entanto, o processo tem caminhado a passos lentos. O dossiê foi submetido para análise do Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep), responsável por votar sua aprovação, logo em sua primeira reunião ordinária em 2021. No entanto, já em dezembro, o prazo para votação do dossiê foi estendido por mais seis meses.
Um grupo de integrantes do Conep chegou a divulgar uma carta aberta esclarecendo à população que, apesar de realizarem esforços pelo tombamento imediato, a resistência por parte do governo estadual tem sido forte em diversas instâncias. Na carta, ainda, os conselheiros defendem que sejam suspensos os processos de licenciamento que seguem sendo conduzidos na serra.
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ajuizou uma ação contra a Tamisa e a prefeitura de Nova Lima, nesta terça, 26, solicitando a suspensão imediata do processo de licenciamento ambiental que permite a instalação do complexo minerário.
De acordo com o MPMG, o projeto viola regras urbanísticas definidas pelo Plano Diretor de Nova Lima. O ponto visado pela mineradora está incluso na Área Prioritária para Conservação da Biodiversidade Especial, devido às suas características de vegetação nativa do bioma Mata Atlântica.
Apesar disso, o município de Nova Lima expediu declaração atestando a conformidade do empreendimento em fevereiro deste ano, ignorando as leis locais de uso da área e permitindo que o “trator passasse”.