Sociedade se manifesta contra invasão da Gerdau em áreas protegidas da Serra da Moeda neste sábadoProjeto Manuelzão

Sociedade se manifesta contra invasão da Gerdau em áreas protegidas da Serra da Moeda neste sábado

30/07/2021

Desde 2006, a Gerdau tem ignorado leis ambientais e avançado sobre áreas protegidas da Serra da Moeda; a partir das 10h, manifestantes pedirão a interdição das atividades da empresa

Ambientalistas, esportistas, amantes da natureza, moradores de Moeda, Itabirito, Brumadinho e proximidades realizarão, amanhã, 31, uma grande manifestação no Mirante de Moeda, para denunciar às autoridades e à sociedade civil os abusos da Gerdau que, à luz do dia, tem avançado ilegalmente sobre áreas protegidas da Serra da Moeda. O mirante está localizado no Km 1 da rodovia LMG-825, que liga o município de Moeda à BR-040, a localização exata está disponível aqui. O início da manifestação está previsto para às 10h.

Com uma extensão de 70 quilômetros, a Serra da Moeda se localiza numa área que abrange porções das cidades de Brumadinho, Nova Lima, Itabirito, Belo Vale e Ouro Preto, além do município que leva o mesmo nome da Serra. Um dos conjuntos de montanhas mais emblemáticos de Minas, além de ser lar de inúmeros cursos d’água e de espécies da fauna e da flora, a Serra da Moeda também é conhecida por apresentar condições favoráveis para a prática do voo livre.

Moradores da região há anos denunciam que as atividades na mina Várzea do Lopes da Gerdau tem avançado ilegalmente sobre a área do Monumento Natural Estadual (Mona) da Serra da Moeda, unidade de conservação (UC) criada em 2010 para proteger as riquezas naturais, arquitetônicas, históricas e arqueológicas do local. O Mona da Serra da Moeda é administrado pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF). O lobby da empresa pela área rendeu até mesmo um projeto de lei (PL) do deputado Antonio Carlos Arantes (PSDB) para alterar os limites do Mona de acordo com os desejos da Gerdau. Após a estrondosa reação negativa, Arantes desistiu do projeto.

No protesto de amanhã, os manifestantes pedirão a interdição da mina Várzea do Lopes da Gerdau. Além disso, cobrarão do Ministério Publico de Minas Gerais (MPMG) e da Gerdau o cumprimento integral dos termos de compromisso assinados pela empresa em 2009 e 2013 que, entre outras medidas, previam que a siderúrgica não solicitasse novas licenças para atividades na Serra da Moeda. Por fim, manifestantes também pedem que o presidente do IEF e o gestor do Mona Serra da Moeda, Henri Collet, convoquem imediatamente nova eleição do conselho consultivo.

Histórico de violações

Para quem passa na BR 040, não é possível ter dimensão da cava a céu aberto que tinha ao menos 900m de extensão por 300m de largura, de acordo com relatório técnico de 2011. Imagem: Lei.A.

O histórico de abusos da Gerdau se iniciou em 2006, quando a empresa implantou a mina Várzea do Lopes sem realizar o estudo de impacto ambiental (EIA) exigido pela legislação, valendo-se somente de uma licença simplificada. No ano seguinte, o MPMG ajuizou uma ação civil pública (ACP) contra a Gerdau, solicitando que as atividades minerárias da empresa fossem interrompidas, até que os estudos ambientais fossem realizados. As atividades foram paralisadas até 2009.

Neste ano, a Gerdau assinou um Termo de Ajustamento de conduta (TAC) com o MPMG e o governo do estado, com o objetivo de reparar os danos ambientais provocados pela extração ilegal na Serra da Moeda. Dentre as 28 obrigações, a empresa assumiu o compromisso de implantar o Monumento Natural Estadual Serra da Moeda e de não solicitar novas licenças para seu empreendimento na área.

Com a assinatura do termo, a Gerdau foi liberada a retomar as atividades na mina Várzea do Lopes.

Não demorou muito até que a empresa se esquecesse de sua palavra e solicitasse, em 2013, ampliação de sua produção de 1,5 milhões de toneladas ano (Mta) para 13 Mta, o que motivou a assinatura de novo termo de compromisso, desta vez, com 33 novas medidas compensatórias.

Em 2019, a Gerdau entrou com novamente com um pedido de licença para implantar uma pilha de rejeitos estéreis de mineração na área onde deveria ser um corredor ecológico. As pilhas de estéril são obras geotécnicas bastante complexas tanto pela heterogeneidade do material quanto pelo processo construtivo, além de causarem grande impacto ambiental. Para isso, a empresa precisava da anuência do gestor do parque, como conta Rosângela Maciel, advogada ambientalista e presidente da Associação Serra Viva.

“Com o governo Zema, o IEF elegeu um mesmo gestor para todo o Quadrilátero Ferrífero. O gestor do Mona, Henri Collet, deu a anuência e só se reuniu com o conselho depois, um absurdo. O conselho não é deliberativo, é só consultivo. Mas a lei obriga que o conselho seja ouvido, a norma que criou o Mona, criou também o conselho gestor.”

Após a reunião, o gestor emitiu outra anuência, e os membros do conselho pediram um mandado de segurança por nulidade na votação. A decisão foi pela invalidação de uma nova reunião para ratificar uma anuência que foi dada sem consulta. No entanto, aparentemente isso foi usado para promover o silenciamento do conselho. “Ele entendeu que não poderia mais ter conselho porque o quis”, afirma Rosângela. A convocação de novas eleições para o conselho do Mona é uma das reivindicações da manifestação de amanhã.

Manifestação organizada pelo movimento Abrace a Serra da Moeda, em 2018. Imagem: Abrace a Serra.

O lobby pela exploração

Desde 2017, foi constatado em um relatório da IEF e reafirmado pelo gestor da UC que a Gerdau ampliou sua cava em 4 mil m² para dentro dos limites do Mona. E, desde então, a empresa vem tentando artimanhas no executivo dos municípios vizinhos ao empreendimento e no legislativo do estado para um processo de desafetação da UC. 

O deputado Antônio Carlos Arantes (PSDB) foi quem tentou passar a desafetação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) por meio do PL 1822/2020. O deputado é conhecido pelas pautas cooperativistas e pelo PL que alterou os prazos para mineradoras na Lei Mar de Lama Nunca Mais. A votação do PL 1822 recebeu críticas e foi reavaliada pela possibilidade da intervenção de robôs.

O passo mais recente nessa longa e violenta história foi a sanção de uma Licença Operacional Corretiva pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) para operação nos limites de 1,5 Mta com vencimento para 2026. A LOC é realizada para a regularização de áreas efetivamente poluidoras/degradadoras que não passaram pelas etapas de licenciamento inicial, como se fosse um licenciamento “retroativo”. 

Assim, a desafetação é feita sutilmente, ou descaradamente, para quem vive nas proximidades e assiste estarrecido as mudanças de demarcações no monumento.

Diversidade ambiental sob ataque

A Serra da Moeda apresenta espécies típicas catalogadas nos campos ferruginosos que sofrem diretamente pelo impacto da mineração, como a deposição de pó minerário, que também afeta a saúde respiratória da comunidade do entorno. Exemplo disso são os cactos Arthrocereus glaziovii, espécie endêmica das vegetações de canga que está ameaçada de extinção.

O campo rupestre ferruginoso possui função essencial na manutenção do ciclo hidrológico da região. Ele atua na infiltração das águas de chuvas e na formação de mananciais subterrâneos.

Além do mais, o local abriga o Sinclinal Moeda, que funciona como uma caixa d’água natural que alimenta as bacias hidrográficas do rio Paraopeba e do rio das Velhas, que abastecem diretamente a Região Metropolitana de Belo Horizonte. A cadeia de montanhas de 70 quilômetros abriga os córregos que deságuam no rio Contendas, que por sua vez abastece o município de Moeda.

A ONG Abrace a Serra foi responsável por criar o Monumento Natural da Mãe D’Água na cachoeira de mesmo nome. Ela faz parte do rico potencial hídrico da Serra da Moeda. Imagem: Abrace a Serra.

A mineração é uma ameaça para o equilíbrio do ciclo hidrológico, como pontua o ambientalista e morador da região Cléverson Vidigal. “A Serra da Moeda é uma cordilheira importantíssima para a Bacia do Paraopeba e a Bacia do Rio das Velhas, divide a água para os dois sentidos. À medida que a demanda vai aumentando, e a produção de água vai diminuindo, corremos o risco de uma crise hídrica e uma escassez para o abastecimento”, alerta. Ele relembra também o risco do fenômeno cone de depressão, decorrente do rebaixamento de lençol freático.

O rebaixamento de lençol freático ocorre pelo bombeamento das águas subterrâneas, de modo a controlar total ou parcialmente o nível estático do lençol freático, é uma prática necessária na mineração. O cone de depressão é exatamente a região que antes continha a água. Muitas vezes, a água após drenada fica abaixo do nível da nascente. Esse efeito funil do bombeamento, sendo o bico do funil onde está instalado a bomba, e a boca do funil o início do cone onde a água converge, afeta e seca as nascentes no entorno. São 56 nascentes protegidas pelo Mona da Serra da Moeda que estão morrendo aos poucos.

O chamado à luta

A manifestação popular pela preservação da Serra da Moeda terá três motes, segundo Vidigal, a paralisação das atividades da Gerdau e o fechamento da Mina; a reivindicação de que o MP exija o cumprimento do TAC e um pedido para que o gestor convoque novas eleições para o conselho da UC. “É preciso que a sociedade se organize para conter o notório descaso das autoridades com o meio ambiente. A regra de Minas tem sido passar a boiada, e nós não vamos deixar essa boiada passar”, reforça a líder da Associação Serra Viva.

Extensão do pico da Serra que faz divisa com o município de Itabirito. Imagem: Abrace a Serra.

A manifestação se reunirá amanhã, dia 31, às 10 horas da manhã, no mirante da Serra, no Km 1 da estrada da cidade de Moeda, a rodovia LMG-825. Os organizadores pedem o uso de máscara e álcool 70%, assim como o respeito ao distanciamento. Os moradores e ambientalistas também planejam um esquema de carona solidária, acompanhe os perfis Não Vale Uma Moeda, Abrace a Serra da Moeda e Associação Serra Viva para saber mais.

 

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