Solidariedade ao povo do Rio Grande do Sul, cobrança aos responsáveisProjeto Manuelzão

Solidariedade aos atingidos pelas inundações no Rio Grande do Sul, cobrança aos responsáveis

08/05/2024

Negligência governamental e desmonte ambiental contribuem para o maior desastre desse tipo registrado no estado; saiba como ajudar

Imagem de satélite mostra dimensão da inundação em Porto Alegre. Imagem: Reprodução Planet Labs.

O Rio Grande do Sul enfrenta a pior inundação de sua história. O estado decretou calamidade pública na última quarta-feira, 1° de maio. De acordo com o último boletim da Defesa Civil, emitido às 12h desta quarta-feira, 8, o estado registra 100 mortos, 128 desaparecidos e 417 municípios afetados por enchentes, em decorrência das fortes chuvas que começaram no fim de abril.

Porto Alegre também passa pela maior inundação da história da capital. O Rio Guaíba ultrapassou o nível de 5 metros na sexta-feira, 3, superando a marca de 4,76 metros registrada há 83 anos, nas cheias de 1941.

Na última quinta-feira, 2, foi detectado o rompimento parcial da barragem 14 de Julho, localizada entre os municípios de Cotiporã e Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, causado pela cheia do Rio das Antas. Dados da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) apontam que outras quatro estruturas estão em situação de emergência, o que significa que correm risco de ruptura iminente, “exigindo providências para preservar vidas”.

“É uma tragédia. Vivemos um momento histórico. Mas não se trata de um fenômeno da natureza. Assombrados, olhamos as consequências de escolhas, normalmente orientadas por ganância, que agridem o meio ambiente, negam a crise climática e inclusive a utilizam como plataforma política de extrema direita.” Escreve a professora e jornalista Sandra Bittencourt, em artigo publicado no portal A Terra é Redonda.

A crise climática vem tornando eventos extremos cada vez mais frequentes em todo o planeta. Tal quadro estava previsto já há algum tempo e a urgência de esforços adaptativos para lidar com o desafio também é discutida há décadas.

A combinação de diversos fenômenos climáticos e vulnerabilidades geográficas do Rio Grande do Sul intensificaram o impacto das enchentes e falhas de gestão contribuíram para agravar a situação. Mesmo diante de recorrentes alertas científicos sobre mudanças climáticas e após diversos informes da MetSul Meteorologia que precederam os temporais e a frente fria, o governo do estado demonstrou pouco preparo para enfrentar a situação e dificuldade em executar ações rápidas para mitigar os impactos.

Foi somente na segunda-feira do dia 29, depois de registrada a primeira grave inundação, no município de Coqueiro Baixo, no Vale do Taquari, que o governador Eduardo Leite (PSDB) compartilhou um vídeo de alerta climático nas redes sociais. Calma e em tom de brincadeira, a fala do governador é extensa, imprecisa e vaga.

Os boletins da Defesa Civil, que já havia registrado impactos em 15 municípios ainda no dia 28, também utilizavam linguagem vaga e não transmitiam nenhum tipo de orientação à população. No dia 30, terça-feira, às 17h, após oito mortes e enchentes graves registradas, a Defesa Civil orientou que a população deixasse áreas de risco e recomendou às prefeituras a adoção de planos de contingência.

No dia 1º, Eduardo Leite declarou que o governo não teria “capacidade de fazer todos os resgates” e as aulas das escolas estaduais foram suspensas. Na mesma noite, 48 horas depois da enchente em Coqueiro Baixo, a Defesa Civil e o governo estadual determinam que a população do Vale do Taquari deixe áreas de risco. No dia seguinte, o Rio Taquari atingiu seu maior nível histórico registrado. Só a partir de então, na quinta-feira, 2, os alertas oficiais da Defesa Civil passaram a caracterizar os riscos hidrológicos como “extremos” e as inundações como “severas”, apontando ameaças à vida.

Antecedentes

Poucos dias antes do início das chuvas, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) enviou a Eduardo Leite o ofício “Alerta ao Estado do Rio Grande do Sul e ao Governador do Estado”, com o subtítulo “Registro para fins de tomada de conhecimento sobre alertas emitidos há várias décadas”. O documento, entregue no último dia 26 de abril, com o objetivo de avisar ao governador que o planeta “está enfrentando uma crise climática”, revela preocupação com a distância e o descompasso entre a gestão e os ambientalistas do estado.

Em 2019, Leite alterou quase 500 pontos do Código Ambiental do Rio Grande do Sul, que estava em debate para aperfeiçoamento há nove anos e contou com a participação de José Lutzenberger, um dos ambientalistas mais reconhecidos do Brasil, na elaboração de seu texto original, de 2000. Especialistas e técnicos apontaram inúmeras falhas e retrocessos no novo código, que levou ao desmonte de décadas de avanços na proteção ambiental no estado.

Dados retirados do Portal da Transparência de Porto Alegre pelo Uol mostram que a prefeitura da capital não investiu recursos na prevenção a enchentes no ano de 2023. Antes de chegar a zero, o investimento no setor já vinha caindo desde 2021, com o início do mandato do atual prefeito Sebastião Melo (MDB).

Mais de 78% dos municípios gaúchos foram impactados pelas chuvas. Foto: Reuters/Amanda Perobelli

As consequências das ações de governantes no Rio Grande do Sul evidenciam os impactos devastadores de uma política de desmonte ambiental em curso no estado. O desrespeito às advertências científicas sobre mudanças climáticas e a negligência na adoção de medidas preventivas resultou em perdas irreparáveis.

Lutzenberger uma vez escreveu sobre as causas e consequências das inundações catastróficas no estado em 1974. As reflexões do ambientalista, 50 anos depois, ganham ainda mais força: “Se hoje os estragos são imensos e os mortos se contam às centenas, não tardará o dia em que os flagelados e os mortos totalizarão milhões. Somos incapazes de aprender com nossos erros. As advertências dramáticas da natureza de nada valem. Insistimos no consumo de nosso futuro.”

Republicamos o artigo “Inundações, suas causas e consequências” nas páginas 31, 32 e 33 da Revista Manuelzão 94.

Como ajudar?

Diversos movimentos sociais estão mobilizando todo tipo de apoio para as vítimas das enchentes, que também afetaram os territórios e a população indígena que vive no Rio Grande do Sul. As ações incluem arrecadação de doações em dinheiro, alimentos não perecíveis, itens de higiene pessoal e de limpeza; além de cozinhas solidárias e brigadas voluntárias de resgate.

Alguns dos pontos de coleta e dados bancários para doações podem ser encontrados nos perfis dos movimentos no Instagram, listados abaixo:

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