Após denúncias de favorecimento, governo de Minas revisa permissões de mineradoras na Serra do CurralProjeto Manuelzão

Após denúncias de favorecimento, governo de Minas revisa permissões de mineradoras na Serra do Curral

22/11/2022

Gute Sicht e Fleurs operam sem licenciamento ambiental, amparadas por acordos com o governo, e são acusadas pela Polícia Federal de atuarem em conluio

O governo de Minas está revisando permissões às atividades das mineradoras Gute Sicht e Fleurs Global na Serra do Curral, conforme anúncio do próprio poder público estadual no fim de setembro, após embargar a Gute. O movimento ocorre após denúncias de que o ex-chefe da Superintendência Regional de Meio Ambiente (Supram) responsável pela Grande Belo Horizonte, Charles Soares de Souza, estaria favorecendo as empresas. Charles foi exonerado à época.

Gute e Fleurs operam sem licenciamento ambiental, amparadas por Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com a Supram. O TAC é um dispositivo capaz de regularizar ambientalmente, em caráter provisório, a operação de uma empresa.

A Gute firmou acordo com a Superintendência em 2021 para explorar uma porção da serra em Sabará, na divisa com Belo Horizonte. Neste ano, o TAC recebeu dois termos aditivos, um deles assinado ilegalmente por Charles e posteriormente cancelado. Já a permissão para a Flerus explorar um trecho em Raposos, fora da área prevista pelo tombamento estadual da Serra do Curral, foi acertada em fevereiro também deste ano.

No dia 15 de setembro, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) manifestou-se no STF pedindo a deliberação imediata sobre o tombamento estadual da serra, paralisado enquanto audiências de conciliação entre as partes são conduzidas pela Justiça mineira. Na manifestação, a PBH também apontava uma série de indícios de que Charles, nomeado por Romeu Zema (Novo), atuava de forma deliberada em favor da Gute Sicht. A exoneração do superintendente foi publicada pelo governo cinco dias depois.

Uma denúncia formal foi apresentada ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ainda em setembro. O documento é assinado por parlamentares e organizações ambientalistas, entre elas o Projeto Manuelzão, e aponta que Charles praticou advocacia administrativa ao cancelar infrações lavradas por fiscais da Supram sem ter competência para tal, perseguir os fiscais responsáveis pela ação e assinar um termo aditivo que permitia à mineradora explorar a área que foi objeto da autuação.

Cedido pela Polícia Militar de Minas à Supram, o soldado Charles também é acusado de atuar por quase um ano como “assessor” no órgão de fiscalização ambiental, sem vínculo formal, enquanto um atrito de hierarquia era resolvido com a corporação. Soma-se ainda o fato de que o ex-superintendente trabalhou, em 2019, para a mineradora Fleurs Global, que a Polícia Federal diz atuar em conluio com a Gute em exploração ilegal. Elas têm um sócio em comum: José Antônio Silva.

Após o abalo

Um relatório interno da Supram obtido pela Folha indica que o substituto de Charles, Daniel dos Santos Gonçalves, tentou se antecipar à crise e pediu a revogação do TAC firmado com a Fleurs, argumentando que o acordo “ampara a regularização precária do empreendimento” e que havia “graves e subsequentes infrações perpetradas”.

No relatório, ele lembra a série de crimes ambientais cometida entre 2018 e 2021 pela mineradora, entre eles o desmatamento irregular em área de no mínimo 20 hectares de cerrado de Mata Atlântica e mata de galeria, intervenção em Área de Preservação Permanente (APP) e assoreamento de cursos d’água da bacia do Rio das Velhas.

Durante esse período, a Fleurs foi alvo da operação Poeira Vermelha da Polícia Federal, que ao fim da investigação pediu o bloqueio de mais de R$ 40 milhões das contas da mineradora para custear os danos à União.

O atual superintendente aponta que mesmo após as infrações o governo firmou um novo TAC com a Fleurs. Ele recomenda a revogação do acordo e a regularização do empreendimento da Fleurs “pela via do licenciamento ambiental”, o que ainda não aconteceu.

A Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), que engloba a Supram, afirmou por meio de nota que a secretária da pasta, Marília Melo, determinou a revisão de “todos os atos autorizativos relacionados à mineração na Serra do Curral”. E que até então “só foi concluída a reavaliação do TAC celebrado referente ao empreendimento Gute Sicht, que culminou no cancelamento do 2º Termo Aditivo e restauração de Auto de Infração anteriormente cancelado”.

Contrariando a recomendação do novo superintendente e a série de suspeitas sobre a atuação das mineradoras, contudo, o juiz Rogério Santos Araújo Abreu, o mesmo que concedeu liminar favorável à mineradora Tamisa em apenas 8 minutos, permitiu a retomada das atividades da Gute, em 28 de outubro, sob o argumento de que a paralisação “causaria prejuízos à atividade empresarial”.

Com informações da Folha de São Paulo.

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