Imaginário

Bandeira do Planeta, idealizada pelo professor Apolo Heringer Lisboa (Foto: Marcelo Andrê/acervo do Projeto Manuelzão)

“O foco principal da proposta do Projeto Manuelzão está na transformação da mentalidade cultural, para nós a questão chave do processo de construção histórica da humanidade; transformação cultural a ser localmente impulsionada pelo objetivo pontual operacional comum: a volta do peixe à bacia do rio das Velhas, alavanca deste processo. A definição desta alavanca tão simples não foi aleatória; resultou da observação de como ocorrem os fenômenos socioambientais e de uma prática teórica árdua e vivenciada. A variável da volta do peixe expressa uma relação complexa que conseguimos compreender. Aplicando-a na estratégia de revitalização de uma bacia, podemos abrir caminho para uma discussão política e filosófica em escala planetária.”

“Em nosso período de vida, a água assumiu papel relevante na avaliação dos acontecimentos enquanto eixo de mobilização, eixo de monitoramento biológico da saúde do planeta e eixo metodológico do processo de transformação política que empreendemos, questionando a geografia político-administrativa do sistema, base na qual ele se sustenta. As bacias hidrográficas, os ecossistemas que o perpassam, o ciclo hidrológico têm sido referenciais metodológicos para nosso trabalho, levando-nos a pensar num mundo sem fronteiras e numa sociedade culturalmente diferenciada, integrada e solidária. Vivemos um tempo que se funda na lógica das tropelias de um sistema baseado na força física, na força do dinheiro e da mentira. A violência contra os mais fracos, independente de fronteiras nacionais, tem base na materialidade da propriedade e do domínio público, intelectual e tecnológico controlado pelo capital financeiro. Trabalhamos pela transformação no sentido da apropriação coletiva do produto do trabalho social e da gestão política, econômica e ambiental enquanto instrumento democrático e sustentável de desenvolvimento da qualidade de vida no planeta Terra. O grande problema refletido pela natureza é a poluição da mente e do coração dos seres humanos por causa da sua ignorância, não basicamente da maldade. Está na sua representação do que somos e do mundo. A filosofia, as artes e a política têm papel fundamental nesta história de superação.

A questão ambiental está inseparável da questão da justiça social, da paz e da democracia. As necessidades de todos os ecossistemas, inclusive humanos, que se concentram cada vez mais nas cidades, exigem cuidados especiais para se sustentarem dentro de uma perspectiva democrática, de justiça e paz. Libertar a política do calendário eleitoral imediato e da ditadura do capital é essencial para equacionarmos, em longo prazo, as demandas sobre os recursos naturais e os seus efeitos sobre os ecossistemas. O centro da questão ambiental é a constituição de um modelo de economia com base global que garanta a todos os seres humanos e aos demais ecossistemas a sobrevivência e o desenvolvimento, valorizando a diversidade cultural e apagando as fronteiras entre países, classes e raças. As águas assumiram papel metodológico fundamental na mobilização e no monitoramento deste processo de transformação da mentalidade cultural de nossa época em escala planetária. A nossa ideia de uma única bandeira para todos os povos é o símbolo desta proposta.”

Trechos de textos escritos por Apolo Heringer Lisboa, extraídos do livro “Projeto Manuelzão: a história da mobilização que começou em torno de um rio”. Organizadores: Apolo Heringer Lisboa, Eugênio Marcos Andrade Goulart e Letícia Fernandes Malloy Diniz. Belo Horizonte: Instituto Guaicuy, 2008. pp. 19; 254-255.

Dica de leitura: Imaginário do Projeto Manuelzão, de Apolo Heringer Lisboa, publicado no livro “Navegando o Rio das Velhas: das Minas aos Gerais”. Organizador: Eugênio Goulart. Belo Horizonte: Instituto Guaicuy, 2005.

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